O CLONE
Fernando Zocca
 
 
Poderia existir mais alguém neste mundo parecido com ele? Alguém de quem se pudesse afirmar que fosse um sósia ou clone, ou cópia, ou seja lá o que possa significar alguém semelhante, idêntico?

Não se poderia afirmar com absoluta certeza, sem medo de enganos que realmente não existia ninguém parecido.

Pelo menos a similaridade era inegável.

Mas naquele dia ele sentia-se atordoado. Não poderia dizer que sofria de labirintite ou que sua pressão arterial estava abaixo da normal. Havia já alguns dias que isso vinha ocorrendo. Logo depois do café da manhã percebia um certo embaralhamento nas idéias. Sua memória vacilava e tinha dificuldade com a locomoção.

Lembrou-se de seu pai. Era 12 de outubro. Dia dos pais. O velho herdara um império econômico que atuava na filantropia. Amealhou bens em cujo rol havia casas e mansões por cinco estados, carros luxuosos, seguranças e aviões a jato.

Porém a saúde financeira da entidade poderosa estava abalada. Havia indícios de preconceito contra homossexuais e ocorriam denúncias na imprensa sobre desvios de verbas.

Mas aquela sua afecção o perturbava muito. Não lhe saía da cabeça. Era uma fixação.

Quando seu amigo chegou naquela noite, estafado por um longo dia de trabalho, soube que pela hipnose poderia descobrir a causa primeira dos seus males.

Eles jantaram, assistiram à novela das oito e foram deitar.

Na manhã seguinte ambos estavam no consultório do Dr. Genic, um famoso psicólogo que utilizava as técnicas da hipnoterapia para cura de fobias.

Considerava que a depressão reativa, as doenças psicossomáticas e bloqueios de aprendizagem eram superados pela "ab reação" ou seja, pela revivescência de emoções dolorosas e suas associações.

Depois de alguns meses de tratamento puderam perceber que a afecção provinha de erros e pecados cometidos em encarnações passadas.

Havia um século houve um crime onde se disparara do alto de uma torre dois tiros contra alguém que morrera baleado no rosto. O projétil atingira o nariz da vítima e trespassara seu crânio.

Tentaram socorre-la porém naquele tempo a energia elétrica era escassa e muito cara. Os equipamentos rústicos impediram a salvação daquela pobre alma. Se tal fato tivesse ocorrido nos dias atuais, a história seria diferente.

O casal saindo satisfeito do consultório entrou no automóvel novo importado e em velocidade compatível dirigiu-se rumo ao ninho. Os preconceitos e perseguições haveriam de se dissipar da face da terra. No rádio notícias indicavam que na Alemanha celebravam-se os primeiros casamentos de gays do planeta.

Realmente o mundo estava mudando. Já não era mais o que sempre tinha sido.

 
 
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