O HOMEM DAS CAVERNAS
Alberto Carmo
 
 
Estava bin Laden a jogar paciência em seu Macintosh, quando Mustafá, seu fiel escudeiro, perguntou:

- Mestre, como consegue ficar tão calmo diante do reboliço geral que assola a humanidade?

- Meu filho, depois de trocar meu velho PC pelo Mac, as coisas ficaram mais claras. Agora sou um homem tranqüilo.

- Mas Mestre, pensei que estivesse feliz com os acontecimentos.

- Menos, Mustafá. O Kibex está atrasado na entrega da minha encomenda. Enquanto esses gringos não acabarem com o estoque de biribas, nem os motoqueiros do Habbib's conseguem trazer minha coalhada. Imperialistas! Vou caçar o franchise desse vendedor de esfiha de terceiro mundo!

- Mestre, está esperando notícias de além-mar? Quer dizer, de além-morro?

- Por Alá, será que eu não vou conseguir jogar sossegado aqui no meu canto? Que poxa! Será que um homem não consegue ter um pouco de paz nem em sua caverna?

- Mil perdões, Mestre. Eu...

- Chega! Se o carteiro trouxer minha encomenda, traga-a imediatamente às minhas mãos!

- Correspondência confidencial, Mestre?

- Não, é uma versão nova do Linux, que eu encomendei na Amazon.com.

- Mas não é melhor esperar o Windows XP? Sai agora em outubro, e dizem que é o bicho.

- Cala-te, infiel! Nunca mais pronuncie esse sacrilégio perante teu amo!

- Desculpa, Mestre...

- Agora vai! E me prepara uma lasanha, que eu estou faminto feito um camelo.

- Tem quatro queijos, bolonhesa, e uma koscher. Qual prefere, Mestre?

- A koscher, com bastante pimenta.

- Tabasco, do reino?

- Não, cumari.

Assim, mister bin e seu mestre de obras sentaram-se à pedra e desfrutaram o repasto. Já na sobremesa - um apfelstrudel de tâmaras - a conversa continuou.

- Mestre, quando vai fazer seu próximo pronunciamento ao mundo?

- Logo, Mustafá. Assim que eu criar umas frases de efeito. Quero ver aqueles gringos sujando as ceroulas. Tenho que bolar alguma coisa que leve o Ibope aos píncaros.

- Posso dar uma sugestão?

- Olha lá o que vais dizer, ignóbil. Se disseres alguma abobrinha, mando-te capar.

- Acho que vai funcionar.

- Então diga logo, antes que eu te despache via DHL para Times Square!

- Seguinte, Mestre. O senhor fica lá falando com aquela espingarda ao lado, certo?

- Certo, é para saberem que eu me defendo.

- Isso é coisa do passado, Mestre. O pessoal já viu o John Wayne fazer isso de monte. Lá todo mundo tem seu Colt embaixo do travesseiro. Precisa de algo mais contundente, que mexa com as lombrigas da América.

- E o que sugeres?

- Que faça o pronunciamento enquanto come. Nada de trabuco ao lado.

- Falar de boca cheia? Eu? Comprometer minha estirpe? Nunca! Guardas!

- Calma, Mestre! Eu não acabei de explicar.

- Falas mais besteiras que embaixador brasileiro.

- Posso continuar, ou a dondoca vai ficar tendo chilique?

- Fala logo, mísero estraga-albardas!

- O senhor quer aniquilar a América física e economicamente, certo?

- Certo.

- E tudo que o Mestre fala e toca vira artigo proibido, censurado, execrado por lá, certo?

- Certo.

- Então! Tá resolvido!

- Fala de uma vez, seu papa-capim! Senão te faço beber dois copos de petróleo sem colarinho!

- Então, o Mestre nem vai precisar falar nada. Basta aparecer mastigando um Big Mac, e depois dar um gole numa coca-cola, assim como num brinde.

- E não falo nada?

- Não, basta arrotar, e dizer com a boca cheia: - Cheers! Wall Street vai entrar em loop infinito! Moto-contínuo, Mestre!

- E as fritas? Eu quero duas! E com molho de barbecue!

- Mestre, tem que mostrar ombridade, seriedade. Coca média, e nada de fritas!

- Guardas!

- Mestre, vai me capar?

- Não, fariseu! Vou mandar um blindado ao drive-through do McDonald's de Trafalgar Square!

- Câmeras, close!

 
 
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