PÃO E BOMBA
Edson Rodrigues dos Passos
 
 
No salão oval da Casa Branca.

- Quero cumprimentar a todos, pelo trabalho desenvolvido com os parlamentares, enfim foi liberada a quantia que pedimos para a guerra contra o terror. Com este dinheiro vamos aniquilar nossos inimigos do terceiro mundo, digo terroristas.

- Um brinde ao presidente - gritou de trás da multidão, um gordo de terno preto, levantando uma taça de cristal que derramava pela borda champanhe francês.

E todos ergueram as taças, com sorrisos alvos e um burburinho típico de confraternizações natalinas.

As champanhes não paravam de estourar, a alegria era tão grande, que não se imaginava que comemoravam o início da pior tragédia humana.

As rodinhas se formavam de acordo com o cargo e salário, Letícia dos Suprimentos, pela primeira vez frequentava uma solenidade na casa Branca, ainda se beliscava para ver se não estava sonhando.

Sua rodinha, de cinco moças do sexto para o sétimo escalão, achou um cantinho perto da janela e conversavam, dentro dos limites de conhecimento, sobre os efeitos da festa, digo da guerra.

Estavam animadas, a maioria delas viravam taças de champanhe, como se fossem refrigerantes em festas de criança. O efeito da bebida aos poucos minava o pudor, pela segunda hora já gargalhavam alto e piscavam para os soldados que faziam a segurança.

W. Bush aproximou-se do grupo.

- Noto que estão se divertindo!

- Estamos discutindo os efeitos da guerra Excelência - disse uma das moças.

- Ora deixe de formalidades......esta noite é de festa, não há hierarquias - W. Bush colocou a mão no ombro de Letícia - mas quais efeitos discutiram da minha guerra, digo da guerra contra o terror?

- Achamos que o resto não vai ver com bons olhos a matança daqueles coitados.

- Que resto menina?

- O resto do mundo.

- Ah o resto do mundo. É verdade, isso também me preocupa, mas tenho milhões de dolares para gastar com bombas.

- Tenho uma sugestão presidente, e se o senhor censurar a televisão e os jornais, o que for bom passa, notícia ruim, nem pensar - disse a mais sóbria.

- Hummmm...me parece boa idéia - W. Bush pensativo.

- Tenho uma sugestão também presidente!

- Então diga meu docinho de côco!

- E se depois de jogar bomba, o senhor não joga alimentos, o resto do mundo vai achá-lo bonzinho - agora quem disse foi a mais bêbada, que se segurava nas outras para não cair.

- Depois de jogar bombas não tem ninguém para comer ! - concluiu a única que não havia bebido.

- Espere - W. Bush pareceu ter visto uma luz - isso é apenas um detalhe, a idéia me parece boa.

- O armazém dos Suprimentos está cheio de comida que sobrou da guerra do golfo - disse Letícia sem jeito, já que W. Bush agarrava-a com os braços e todos os dedos que tinha direito.

- Mas aquela comida não está vencida ? - retornou a cena a que não bebia.

- Só seis meses - respondeu Letícia.

- Então tá ótimo, vamos usar a idéia de vocês - Disse W. Bush se recompondo de sua sem vergonhice, quando se aproximavam os Secretários de Estado -

- ......foi bom que se aproximaram, acabei de ter uma idéia brilhante - as moças olharam revoltadas para W. Bush - quer dizer, acabamos de ter uma idéia brilhante: vamos jogar bombas e depois comida vencida do armazém, digo alimentos para os sobreviventes.

- Mas quem vai comer aquela comida ? - estranhou o secretário de Defesa.

- Detalhes, sempre dando importância aos detalhes, o importante é a frase que vou mandar por na CNN: "Bomba e Pão".

- Presidente! - chamou tão baixo Letícia, que quase foi um sussurro - presidente.

- Hã... o que foi?

- Posso dar outra sugestão?

- Claro que pode.

- Acho melhor "pão e bomba", pode pegar mal com o resto.

- Que resto ? - estranhou novamente o secretário de defesa.

- O resto do mundo ! - entonaram em coro todos, inclusive o presidente.

- Bem, que seja feito, meu pai vai ter orgulho de mim, vai ser a guerra do "pao e bomba".

- Não necessariamente nesta ordem - enfim riu o Secretário de Estado.

 
 
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