BOA NOITE, MARIA!
Claudia Barros
 
 
Era dezembro. Estava uma noite quente de verão e ela não conseguia dormir. Seu nome era Maria e vivia nas ruas.

Não saberia dizer havia quanto tempo vivia lá. As suas mais remotas lembranças já tinham lugar naquela ponte perto do rio malcheiroso.

Dos pais, não se recordava. De irmãos, tampouco. A família que conhecia eram pessoas que, como ela, também moravam em algum canto da cidade, ao relento, e tinham um futuro tão incerto quanto o dela.

Pelo que diziam, deveria ter dez anos. Nunca tivera uma roupa nova. Nem brinquedo. Nem Natal. Sabia que Papai Noel existia, mas haviam dito que ele existia somente para quem tinha dinheiro. E ela tinha tão pouco. Apenas algumas moedas que recebera no semáforo.

Talvez a falta de sono fosse falta de comida no estômago. Talvez fosse tristeza mesmo. Naquele dia, vira o Papai Noel em frente a uma loja dando pirulitos para um monte de crianças. Ela queria um, mas não teve coragem de se aproximar.

Ficou olhando, de longe. Ele parecia tão bonito, tão inalcançável. Ficou triste. Pela primeira vez percebeu que era excluída. Não que ela soubesse o que a palavra significava, mas pela primeira vez ela sentiu-se excluída.

Fechava os olhos e o sono não vinha. O estômago fazia barulho. A mente de criança dava voltas e mais voltas por lugares bonitos, com brinquedos, carinho, pai e mãe.

De repente, o sono veio. Em princípio leve. Depois foi levando a criança para um outro mundo. Um mundo diferente, em que ela ouviu palavras mágicas, vindas de um velhinho de barba branca e roupa vermelha: "Boa noite, Maria!"

Sentiu tamanha felicidade que, mesmo dormindo, um sorriso surgiu em seu rosto sujo. Agora ela tinha um Papai Noel todinho seu. Isso, ninguém ia tirar dela.

 
 
fale com a autora