QUASE PRIMEIRO BEIJO
Marcel Agarie
 
 

O tema de hoje é sobre o beijo. Beijo que demonstra amor, beijo que demonstra carinho, beijo que demonstra agradecimento. Enfim, existem diversos tipos de beijos, mas existe um que a gente nunca esquece. O primeiro beijo.

Particularmente, não é o primeiro beijo que tornou-se inesquecível para mim, e sim o meu "quase primeiro beijo", que hoje, agradeço a todos os santos por ter sido "quase", pois seria esquecível, caso o beijo de concretizasse. Leia e veja se não tenho razões para agradecer.

Eu tinha mais ou menos 11 anos, quando aconteceu o meu "quase primeiro beijo". Existia uma garota em meu bairro, alguns anos mais velha que eu, que carregava consigo um apelido - talvez um pouco sugestivo - de Ediqueixo.

Este maravilhoso apelido de Ediqueixo, surgiu graças a fusão de Edilene com queixo, que para um bom entendedor, já imagina o "pequeno" queixo que a garota carregava junto ao seu maxilar. Neste instante, limpe a sua mente e pense em um rosto qualquer. Agora aumente a sua testa, empurre os olhos e o nariz para dentro, e o tamanho que você imaginou para a testa, multiplique por dois, para calcular o tamanho do queixo. Pronto!! Você está vendo a Ediqueixo em sua mente. Olhando de perfil, seu rosto formava a silhueta da lua crescente.

Início de adolescência é assim, todos passam por essa pressão do primeiro beijo. Sem contar que a pressão aumenta, conforme os seus amigos vão dando os seus primeiros beijos e você vai ficando para trás, e para trás. Comigo foi assim, de toda a turma, ficara eu e mais quatro amigos, que prefiro não relatar os seus nomes para não comprometê-los, mas vou intitulá-los com seus apelidos de infância, para que possam distingüi-los no texto.

Kichute, Tatu, Rainha-Diaba, Neguinho do Pastoreiro e eu. Estes eram os "cabaços" (gíria usada para chamar pessoas que não tem experiência em determinado assunto ou atividade) que eram zombados pelos que já haviam dado o primeiro beijo.

Graças a pressão de nunca haver beijado, o desespero foi aumentando, e acabaram criando um plano para nós - os cinco "virgens de boca" - tirarmos a boca da miséria, e conseguir beijar alguém.

O plano era encontramos com Ediqueixo atrás da igreja, um por vez, e beijá-la, pois ela havia acertado com um amigo, e aceitado ajudar.

Quando me falaram que estava tudo combinado, que era só chegar, fechar os olhos e beijar, achei que era a nossa grande oportunidade, e ao mesmo tempo o fim. Eu? Beijando a Ediqueixo? Não conseguia imaginar.

Senti que todos queriam ir logo, mas ninguém tinha coragem. O meu amigo Kichute tomou a frente e foi o primeiro. Chegou ao lado dela, conversou uns cinco minutinhos e a beijou. Todos olhavam um para o outro, sem saber se ria ou se criava coragem para encarar aquela boniteza de frente.

O Kichute voltou e logo em seguida foi o Neguinho do Pastoreiro encarar a Ediqueixo. Alguns minutos de conversa jogado fora e o beijo. Que loucura estávamos cometendo! O Neguinho do Pastoreiro foi o que deu o beijo mais longo.

Faltava eu, o Rainha-Diaba e o Tatu. O Rainha-Diaba se propôs a ser o próximo, que foi aceito por mim e por Tatu, afinal eu ainda não tinha coragem para enfrentar aquela mistura de queixo comprido com Tina Tuner e acredito que o Tatu também não, com isso o Rainha-Diaba não perdeu tempo, e chegou beijando a Ediqueixo sem conversa. Agora só faltavam dois. Não percam as contas!!

Eu não queria ser o primeiro e muito menos o último. Imagina a fusão de salivas que estavam na boca da Ediqueixo. Era melhor continuar "virgem de boca" a encarar aquela situação. Porém em nossas mentes, estavam nossos amigos gozando da situação de nunca ter beijado, e isso era o que nos incomodava, sem contar que agora restava apenas eu e o Tatu.

Acredito que pensando nas possíveis gozações, Tatu criou coragem e também beijou aquele "queixo". Era o fim, faltava apenas eu.

Neste instante pensei realmente em encará-la, mas era impossível. Se ao menos ela fosse um pouquinho bonitinha, só um pouquinho, mas não era, e isso me impedia de encontrar coragem. E nesse vai e não vai, Ediqueixo acabou se irritando com a minha enrolação e indo embora para minha tristeza (ou alegria), concretizando ali o meu "quase primeiro beijo".

Depois disso, todos continuaram me gozando, até acontecer naturalmente o meu primeiro beijo, uns dois meses depois.

Ainda hoje, mais de dez anos depois, todos lembram deste fato, porém as gozações mudaram de lado. Eu que fui o último a beijar, e tive que agüentar por algum tempo as provocações de meus amigos, torturo-os fazendo recordar daquela noite "maravilhosa" que tiveram com a Ediqueixo, marcado pelo primeiro beijo de cada um e pelo meu "quase primeiro beijo".

 
 
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