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Larissa Meo
 
 
"Quando eu era jovem achava que
o dinheiro era a coisa mais importante
do mundo. Hoje, tenho certeza"
- Oscar Wilde -

"O que mais me incomoda no dinheiro
é que ele é um fator limitante"
- Maria Clara, a mulher invisível -

Outro dia pensei: preciso dar um jeito na minha vida profissional. Essa coisa de ser criativa só nas festinhas dos filhos ou no orçamento da casa está um pouco complicada. Afinal, o que eu faço com o meu diploma de Artista Plástica? Lembro-me da história como se fosse hoje. Depois de quatro anos pastando na universidade eu queria o melhor diploma, ou pelo menos, o mais caro. E apesar de me considerar ecológica esfregava as mãos só de pensar que o meu diploma seria de pergaminho. Igual ao do meu pai, pensei. Se ele conseguiu um eu também posso. Quanta idiotice. Hoje sei que o tal papel não serve pra muita coisa. Nem pra decoração. Aquelas letras em estilo quase gótico e a moldura de pátina não combinam com o azulejo da cozinha, muito menos com o fogão.

Na verdade eu precisava tomar uma atitude drástica. Ficar choramingando ou esperar a próxima crise existencial cair como um raio sobre a minha cabeça só piora as coisas. Resolvi que era a hora de reciclar. Reciclar a profissão, os amigos e mais tarde até, quem sabe, o marido. A minha ex-amiga Simone Denise disse que é ótimo.

Gastei meu tempo e sola de sapato em busca de algo inspirador. Não consegui muita coisa. O que mais me chamou atenção foi um curso de especialização batizado de MBA. O tal curso era a minha cara, mas naquela universidade e por aquele preço, ele só era oferecido on-line. Como sou out-line perguntei para a moça da secretaria como a coisa funcionava. Depois de entender os detalhes fiquei muito chateada. Eu não tinha computador. Como iria acompanhar um curso assim? A saída de emergência era comprar uma destas máquinas maravilhosas e me embrenhar no admirável mundo novo. Afinal, até o frango com legumes que comi no almoço tinha mais tecnologia do que carne. Eu, na verdade, estava bastante atrasada nesta questão e o destino parece que me deu um ultimato.

Tracei uma estratégia imbatível para conquistar meu objetivo. Fiz para o jantar o prato preferido do Roberto: Rabada. A sobremesa era manjar de coco, com calda de caramelo e ameixas carnudas. Teve até cafezinho. O segundo passo da estratégia consistia em colocar as crianças para dormir mais cedo. E não tardou para que eu decretasse a lei da vaca amarela. A sós, aos poucos fui chegando mais perto e mais perto. O Roberto nem percebeu minha intenção. Ele só levou um susto quando me viu sentada ao lado dele no sofá assistindo a TV, sem fazer uma crítica sequer. Eu e Roberto temos uma sutil divergência em relação à programação da telinha. Ele adora vale-tudo e eu gosto de documentários. Para evitar brigas decidi então não assistir mais TV. É como eu sempre digo: não há nada num casamento que não possa ser resolvido até as Bodas de Prata. É claro que se a divergência persistir eu mesma aconselharia um divórcio.

Depois que o bárbaro para quem ele estava torcendo venceu a parada eu aproveitei o clima de ringue e joguei o Roberto na lona.

- Roberto, decidi que preciso me reciclar e vou comprar um computador.

- Computador? Mas você não sabe nem datilografia, Maria Clara.

- Eu não vou fazer datilografia, Roberto. Descobri um curso de MBA que é o máximo e tem tudo a ver comigo. O único detalhe é que ele é on-line. Como não temos computador decidi que está na horta da gente comprar um.

- Mas o que você vai fazer com um curso de Master Bussiness Administration?

- Master o que?

- Você não falou que o curso é de MBA?

- O curso é de Moda, Beleza e Afins, Roberto.

- Mas você desistiu de montar seu ateliê?

- Onde eu vou montar um ateliê? Na garagem do prédio? Além do mais artista é o que não falta por aí. Na hora H todo mundo é artista.

Decidida a mergulhar de cabeça nesta história da reciclagem fiz pesquisa das marcas, da potência e dos preços das máquinas. Mas, o que pesou mesmo para a escolha do tal computador foi o design. Infelizmente ainda não me habituei a conviver com o feio eficiente. Prefiro um computador bonito burro, se é que existe algum.

Passada a fase da escolha, veio a da instalação. Das caixas começaram a brotar centímetros, depois polegadas, metros, quase quilômetros de fios. Era fio que não acabava mais. Fio ligando aqui, fio ligando ali. A tal Ariadne, aquela que tirou Teseu do labirinto do Minotauro, morreria de inveja de mim. Eu com os meus quilômetros de fios e ela com aquele singelo novelinho.

A esta altura fazer uma ligação perigosa podia causar um estrago em tanto. Precisei ler o manual de instrução umas 30 vezes e mesmo assim os tais fios não me inspiravam confiança. Depois de todo o meu esforço não valia a pena ser impulsiva, pensei. A minha lógica feminina me aconselhou a esperar o Roberto. Afinal, ele não era engenheiro? Devia entender pelo menos de fio.

Finalmente a telinha ficou azul e o programa começou a rodar. A minha aventura para desvendar as redes telemáticas exigiu persistência e óleo de peroba para passar na cara. Devo reconhecer que as minhas primeiras cem incursões pela tal Internet foram um fiasco total. Eu certamente era a navegante mais barbeira da web. A sorte é que estava escondida em casa, atrás da tal telinha, mas o técnico do meu micro prefere encontrar a mulher com o amante a receber uma ligação minha.

Aprendendo com os erros e comemorando com os acertos, com o tempo peguei o jeito. E agora estou viciada. Todo santo dia, como hoje, eu ligo o meu computador pra saber qual é a boa.

 
 
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