NO BLOCO DA SIMPATIA
Carlos de Paula

Sequer tinha certeza de querer sair no bloco. Sabia que gostava de carnaval, e especialmente de imaginar as ancas maravilhosas da Luana requebrando um samba-enredo inteiro. Mas esse negócio de bloco, com aquele povo todo suado encostando nele, se chacoalhando e empurrando fedor por suas narinas adentro, aquilo era a antecâmara do inferno!

Buscou no fim de tarde o barzinho na Rio Branco, "Simpatia é Quase Amor", querendo inconscientemente se convencer de que seria ótimo aceitar o convite da Luana e, pela primeira vez em sua carioca existência, sair num bloco. Seu carnaval sempre tinha sido em clubes, Bola Preta, Democráticos, o Internacional, no Calabouço, Sírio e Libanês, tudo no capricho, sem bagunça, só felicidade! Como exceção, raros anos de camarote na avenida.

Um chopp e as lindas, amplas nádegas, já começaram a se sacudir em sua mente, sussurrando: "Esqueça o olor do mundo e naufrague neste oceano perfumado..."

Outro chopp, meu amor, mais um e tudo se consumará. Fora assim, nesse ritmo, na festinha de fim de tarde no escritório, que a danadinha começara o aliciamento. Cerveja vai, cerveja vem, hora de dançar e "Quiéquiéisso, meu nego?! Tá no atraso, é?". E ria, a descarada, deixando-lhe no maior embaraço, resgatando da adolescência os comentários sobre o drops ou sobre a garrafa de coca-cola no bolso do guri.

Percebendo a tormenta, Luana, a mais querida do povo, a mais bonita, a mais gostosa, encostou a boquinha rosada em seu ouvido e o enlouqueceu assim: "Fica frio... Sempre simpatizei com você... Notou, não? Pois é... E simpatia, você sabe..."

Sim, claro. Tem até poema sobre isso, se lembrava de ter grunhido, o tesão a sufocá-lo. Ela gargalhou: "Isso! Além de simpático, letrado! E tem também um bloco com esse nome, sabia? Vamos pular o carnaval nele?" Era o fim do inferno, entrada no paraíso, era a boca da menina novamente disfarçando o pecado.

O último chopp gelado e a rendição. Agora não tinha mais volta, o negócio estava fechado. Saiu do bar, alívio no peito, chutando tampinhas pelo caminho, moleque de novo, prestes a triunfar no carnaval.

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