PAPO DE ACADEMIA
Reinaldo de Morais Filho

Não deve haver quem suporte o papo de academia. Dicas e mais dicas de beleza, novas descobertas da cirurgia plástica, traição, falsidade, a vida fútil de cada um. Desprezo completamente, esqueço as vozes com a dor no músculo, converso com os espelhos.

E se não houvesse espelho na academia... Observo a gordura indesejável, o pneu persistente, a roupa apertada. Quase comento com alguém, mas, olhando em volta, ninguém interessante. Um simples comentário me faria prisioneiro, colega, amigo.

Na bicicleta ao meu lado, um outro dia, uma senhora - as rugas nas mãos indicavam no mínimo quarenta velinhas - chorava silenciosamente, engolia as lágrimas a seco. Era meu primeiro mês na academia, inocente. Fiquei tocado e tentei puxar um assunto.

A dor, a angústia, o lamento, tudo porque havia cortado o cabelo muito curto, achou feio, o marido reclamou, as amigas cochicharam. E agora, só restava sofrer enquanto tomava hormônios de crescimento, enquanto rezava aos céus. Senti náuseas, senti vontade de nunca mais voltar naquele recinto.

Uma semana depois estava de volta, brigando com minhas curvas, suando em bicas, calado. Aprendi a lição e, a partir daquele caso, apenas balbuciei as palavras necessárias: peço socorro quando o peso é demais para mim.

Voltei, sim. Mas, não sem ter uma crise psicológica. Será que não sou eu, também, frívolo como os outros? Concluí que não. Forcei-me a não concordar. Estava fazendo aquilo em prol de uma vida mais saudável, em favor da minha auto-estima, como uma atividade acessória e não principal.

Há tempos já desistira da busca do corpo ideal. Em trinta anos, as gorduras localizadas nunca me abandonaram, os músculos nunca se firmaram. Busco, somente, não piorar minha aparência, aumentar a barriga, tornar-me um gordo repugnante. A duras penas tenho conseguido.

E tudo ia bem até hoje... tudo ia conforme meus planejamentos. Em cinco meses já me acostumara com as conversas (quando não consigo tirar meus ouvidos da sala apertada). Nem me incomodei tanto quando um aluno decidiu se tornar o centro das atenções, o informante, o fofoqueiro.

A cada dia chegava com uma novidade, que leu em um jornal, que descobriu com alguém influente, que deduziu através da sua lógica absurda. Os Estados Unidos estavam temendo ataques do exército brasileiro - treinado na Amazônia; Yves Saint Laurent se aposentou e estaria agenciando novos talentos - um deles a Sandy (& Júnior); nonsense.

Entrei em aulas de meditação transcendental (que afirma ser possível meditar em qualquer lugar) para suportar. Aprendi a contar até cem, treinei minha paciência antes limitada. Juro que nem me importava com as dicas de beleza.

Até hoje... Quando entrei na academia, em um grande cartaz no mural, estavam os eleitos do ano. Os mais bonitos, os mais disciplinados, os mais chatos. Eu. Fui eleito o mais chato, o mais antipático, Mr. Simpatia (quando esses trogloditas aprenderam sobre a ironia?).

Tapinhas nas costas, risos contidos, exagerados, humilhantes, risos por todos os lados. E o que me lembro, depois que cheguei ao número duzentos e trinta e dois, são várias pessoas em cima de mim, um mata leão, socos e chutes. Como se eu devesse ter sangue de barata, como se a simpatia fosse mais importante do que a honra, a hombridade, o caráter. Golpeei o primeiro que meu punho alcançou.

E agora estou aqui, neste hospital de segunda, escrevendo porque não me disponibilizaram uma televisão, porque a enfermeira não atende ao chamado da campainha, porque nenhum amigo veio me visitar...

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