SIMPATIA
Virgínia Pinto e Nosé

Já era tarde da noite quando saí do trabalho, mas ainda tinha uma tarefa, passar na farmácia e levar para casa um remédio para febre, pois minha filha caçula estava doente.

Entrei com aquela pressa característica do paulistano, fui direto à prateleira do medicamento com a idéia de sair rapidamente. Me detive ao ouvir uma mulher oriental, perguntar ao balconista sobre um medicamento que ela mal conseguia soletrar o nome em português. Era estrangeira e isso é comum no meu bairro.

De repente esqueci da pressa e me aproximei do grupo, pois os balconistas tentavam, em vão, entender o nome que ela dizia.

Arrisquei, perguntei a ela em inglês, se ela sabia o nome do medicamento naquela língua. Seu rosto se iluminou e a minha pergunta fez ela começar a dizer que o filho estava doente, com dor de garganta, de cabeça, o nariz escorrendo e que em seu país usava aquele tal medicamento. Minha vontade de ajudá-la se transformou numa questão de vida ou morte, pois era uma mãe pedindo ajuda a outra.

Comecei dizendo que sou dentista e não médica , mas que poderia tentar ajudá-la. Ela se animou mais ainda. Dentista? Que bom, preciso de uma para meus filhos. Eu nasci no Japão, morei na Austrália aonde meus filhos colocaram aparelho nos dentes mas meu marido foi transferido de lá e tive que tirar os aparelhos e fomos morar aonde estão explodindo as bombas e tivemos que sair de lá também. Eu não entendia tudo o que ela falava, mas ela demonstrava estar muito feliz em poder falar comigo.

Voltei ao nome do remédio. Descobrimos juntas um similar que ela poderia levar e cuidar do filho. Entreguei a ela um cartão com meu nome e endereço profissional, dizendo que estaria às ordens para ajudá-la no que fosse possível, inclusive para encontrar um médico para atender ao filho. Ela agradecia o tempo todo, com aquele jeito oriental de se curvar em reverência, repetindo algumas vezes:- Muito obrigada, você é muito amável!

Fui embora pensando naquela mulher, como a vida do outro pode ser difícil e como podemos ajudar quando nos dispomos a olhar no que acontece ao nosso lado.

Dias depois, conto à minha irmã o que tinha acontecido e ela comenta:- Este é o nosso jeito brasileiro de ser. De sermos simpáticos, de nos comunicarmos com as outras pessoas, de não termos barreiras culturais e isso é o que encanta o estrangeiro que aqui chega.

Me convenço disso e me alegra lembrar do sorriso daquela mãe ao se despedir de mim.

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