PECADOS
Fátima de Carvalho Palácio

A linha da preguiça.Sobre a mesa.Desenhei com lápis de cor. Está tão de manhã, tudo claro, cheirando a café com pão e manteiga.

Minha casa com todas as janelas abertas, o vento em repouso. Nada se move.

Nem mesmo meu sono que nunca está desperto a essa hora. Ele olha para mim,imóvel na porta do quarto.

Olhos vermelhos, congestionados de avenidas, de sim, de não, de talvez.

Uma manhã para nada fazer. Apenas por querer.Flutuar na preguiça, sem esforço.

O telefone toca, inútil. Seria um demasiado esforço ouvir agora.

Falar então seria assassinato.

Não quero ser uma serial killer do silêncio.

Quero assistir em câmera lenta a preguiça dançar com o sono. A alegria do primeiro movimento. O primeiro passo assim sem certeza.

Um casal cúmplice,sem ideais de competição.Tão fora de moda esse casal.

Quem conduz quem?

O sono brinca com a preguiça.Passo de tango, o movimento da procura do prazer.

A preguiça está de vestido vermelho. Sedutora como uma verdadeira preguiça.

Minha preguiça tem olhos azuis. Por que eu gosto de ter uma preguiça ícone. Parece filme americano.

Meu sono, bem esse meu sono. Tão inconstante tão paranóico. Às vezes ele precisa de auxilio, vai até o armário de remédios. Olha embalagens, toma overdoses.

Às vezes vai até o bar, enche o copo de tequila. Meu sono gosta de tequila. Com sal.

Mas quase sempre ele apenas fecha os olhos. Como um vampiro na presença do sol.

Tão bom ficar no meio da manhã, apenas olhando. Como um astrônomo olha para uma estrela, olho para o casal gerador de meus pecados. Claro, na visão católica.

Sinto um cheiro de manga madura.Cortada em fatias finas geladas.Pressinto que meus dançarinos querem cometer a gula. Que completa o triângulo.

Tenho que ir fechar a porta. Para a casa ficar quieta...

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