ALICE PERDIDA
Luciano Cesar Cunha

A chave virou macia e a porta abriu. Alice espiou pela fresta aberta e, curiosa, já foi logo se atirando pra fora. Enfim havia encontrado a porta da rua e desta vez o mundo lá fora não parecia estar ao contrário.

Alice fechou a porta atrás de si, nem ao menos guardou a chave. Agora ia se perder naquele tabuleiro de xadrez, cheio de quadrados e triângulos, as ruas perpendiculares ou em ângulos, emaranhadas umas cons as outras. Alice olhou para cima e viu que a placa dizia Avenida Afonso Pena. "Onde será que vai dar?" Decidiu caminhar para a esquerda. Depois desistiu e voltou caminhando pela direita. "Vou seguir o sentido horário só dessa vez, pra ver se não cometo nenhum erro." Dobrou à direita, onde a placa dizia Avenida São João. Outra direita, na Avenida Brasil. E outra vez, na Quinta Avenida. 

No caminho, nada chamava a atenção de Alice. Concentrada em si mesma, ela só pensava em tudo pelo que havia passado e como foi capaz de escapar. Alice não ouvia o barulho, não enxergava as cores, não sentia cheiro de nada. Não sentia o vento soprar, nem o calor do sol. E as pessoas, aos montes, iam passando por ela, mas Alice não se dava conta. 

Até que, quando ia virar à direita outra vez, veio o estalo. A placa na esquina dizia Avenida Afonso Pena. "Estou andando em círculos. Ué, se as ruas são retas, como posso estar andando em círculos?" Então Alice levantou os olhos e viu, sentiu, cheirou, descobriu tudo o que estava ao redor. Do céu, nuvens, sol até os telhados e postes, dos prédios e casas até os jardins e as ruas, do chão e dos carros até as ávores e as pessoas. As pessoas, as pessoas. E todas aquelas ruas, embora em ângulo reto, quadradas, de repente eram círculos, que davam voltas e voltas, onde não se podia enxergar o fim. E as coisas finalmente começaram a fazer sentido para a pobre Alice. 

"Onde será que estas ruas vão me levar? E quem estará esperando por mim na próxima esquina?"

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