AQUELE OLHAR
Pedro Feitosa

Eu tinha certeza que era ela. Pelo jeito de caminhar, despojado, sem preocupação, aquele "andar sem compromisso". Estava alguns metros a minha frente, passos determinados dignos de sua personalidade forte.

O cabelo estava em desalinho, muito normal para quem a conhece, ela nunca teve essas preocupações de beleza que as mulheres geralmente têm. Aliás, ela sempre foi do contra: enquanto as colegas de aula iam ao shopping comprar roupas da moda e paquerar, ela ficava com os meninos conversando sobre bandas de rock internacional; na época em que essas bandas estavam fazendo sucesso, ela estudava misticismo e astrologia, sempre diferente das outras meninas. 

Hoje, provavelmente está mais madura, com idéias muito mais avançadas das que tinha quando a conheci. Talvez seu olhar não seja mais de menina recém entrando na juventude; se bem a conheço, seus olhos demonstram segurança e ambição. Deve estar com uns vinte e dois ou vinte e três anos, nem de longe lembra aquela menina que era na sua festa de quinze anos, onde tomei meu primeiro porre. 

Ela continua seguindo seu caminho, agora pára e acende um cigarro. Lembro que naquela época ela já fumava escondido nas dependências da escola. Suas médias não eram lá essas coisas, mas nunca reprovou; os professores percebiam que ela era diferente, mas a tratavam com igualdade.

Nesse meio tempo tento me aproximar - em vão. Ela acelera o passo e consigo observar seu perfil. Estranho, não o reconheço. Será que é ela? Como posso ter me enganado? Acelero os meus passos, ela pega um táxi. 

O motorista arranca o automóvel, não consigo ver seu rosto. Começa a chover, procuro uma proteção. Nesse instante imagino se era ela, a garota do olhar tão enigmático que poucos conseguiram decifrar seu segredo.

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