Atualização 062 - EM CIMA DO TELHADO
BIOGRAFIA
MARIA MOLECA
Raquel Santos

 

Quando pequena sempre fui muito "Maria Moleca" e por mais que minha mãe se esforçasse em manter-me uma "patricinha", quando ela se distraía lá estava eu de novo com caca no nariz, toda suja de areia ou no quintal do vizinho brincando de estilingue.

Hoje, fico imaginando qual deveria ser o sentimento da minha mãe que sempre sonhou que seu primeiro filho fosse uma menina e que quando grávida até chorou diante o espelho, indagando o que ela ia fazer da vida se viesse um menino. Meu pai soube secar as lágrimas daquela mocinha de 21 anos e Deus soube ouvir suas preces. Mas, "delicadinha" como uma menina, era algo que eu não me mantinha por mais de meia hora.

De cabelinhos lisos, minha mãe fazia minhas marias-chiquinhas e colocava um vestidinho dos mais caros para em seguida eu dizer: "Mamãe posso brincar aí na frente?" (E claro que nessa hora eu bem sabia ser delicada), mamãe se derretia e deixava.

Em cinco minutos estava eu ladeira abaixo com o carrinho de rolimã. Não cansava de subir toda a ladeira outra vez para mais uma aventura. 

Lembro bem dos meus amiguinhos: Biquinha, Eronzinho, Rubinho e tantos "inhos" não apropriados para colegas de uma garotinha de cinco anos.

Quando não era o carrinho de rolimã, era uma pelada no campinho ou empinar pipa com meu pai. Acho que foi meu pai o grande culpado por essa minha afeição por brincadeiras de meninos. 

O "véio" me levava para empinar pipa, para assistir jogo no campinho (com o uniforme do Corinthians); e como vivíamos em um vilarejo ferroviário no alto da serra, a Vila de Paranapiacaba, não faltava uma floresta pra ir com ele buscar plantas para minha mãe ou caçar passarinhos. Às vezes também me metia a "trabalhar" com meu pai passeando em locomotivas velhas observando os trilhos passarem bem rápido.

Sempre acreditei em Papai-Noel e com isso tive as melhores bonecas, as mais caras. Lembro de algumas: Bate Palminha, Tippy, Bochechinha e mais tarde outra Bate Palminha e outra Bochechinha, pois praticamente destruí as primeiras. Mas as bonecas não me prendiam atenção por mais de uma semana. Deixava sempre as coleguinhas brincarem e estragarem por mim. Mas, o Autorama, Motorama e Ferrorama permaneceram intactos comigo até a adolescência e um pouco mais (boneca não restou nenhuma).

Também não desgrudava da TV, para sossego da minha mãe que me via limpinha e tranqüila dentro de casa. 

Sabia todos os desenhos de cor: Maguila - O Gorila (Que eu pronunciava Maguilovoina), Biônica - A Formiga Atômica, Bambalalão e entre tantos não podia faltar o Super Homem (para a Mulher Maravilha eu não ligava).

Certo dia minha mãe entretida nos afazeres domésticos, pensou: "Mas a Quel está tão quietinha! Estará comendo meus batons outra vez?" (meu lado feminino). E saiu a procurar-me, quando quase enfartou ao ver-me em cima do muro (apesar de ter sido minha vontade estar em cima do telhado) com uma toalha de rosto amarrada nas costas e dizendo: "Sou o Super Homem e vou voar pra salvar o mundo". Minha mãe que de morena já não era mais nada, ficou paralisada com o susto e não conseguia fazer outra coisa senão gaguejar pedindo encarecidamente pra que eu descesse, pois poderia cair e me machucar; mas, ao mesmo tempo eu respondia "Eu sou o Super Homem, o Super Homem. Sou de aço".

Em tempo a "mami" ergueu os braços e pediu pra que eu "voasse" pra salvá-la e assim foi que ela me salvou.

Hoje ainda levo o desejo de ter subido em cima do telhado como havia visto no desenho, mas já não posso, pois tenho medo de altura! 

E antes que vocês perguntem assustados ou curiosos, eu digo de antemão: Depois da adolescência me tornei delicada e feminina.

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