LEMBRANÇAS DE GUERRA
Marco Brito

Passatempo, passa a vida
Passaporte para a morte
Passa o tempo, passa batida.
Passa rápido como a sorte...

Os versos não lhe saíam da mente.

Quanto mais sofria , mais nítidas martelavam-lhes as palavras.

- Passatempo, passa a vida...

Doíam-lhe, os versos, dentro do cérebro. Latejavam-lhes nas têmporas. Contorciam-se-lhe nas entranhas. Esvaíam-se lentamente, junto com seu sangue, que lhe fugia pelos ouvidos.

Não lembrava de tê-los lido em lugar algum de sua vida. Não se recordava de tê-los escrito alguma vez.

- Passa o tempo, passa batida...

Olhava para cima por falta de escolha - impedido de virar o pescoço à espreita da salvação - e via a cor do céu azul, ao tempo que lhe cegava o fulgor do sol. Queimavam-lhe as entranhas, do mesmo modo que queimava a pele esfolada do corpo.

Nunca as havia usado como porta-voz da crueza das batalhas. Agora, escreviam-lhe sua própria fatalidade.

- Passa rápido como a sorte...

Acima da sua cabeça, como estertores de obuses, em compasso com seu coração, batiam asas de abutres. 

Esperando-lhe apenas o fechar das pálpebras.

- Passaporte para a morte...

Guerra, sempre maldita guerra. Urbana, desumana,travada no asfalto, na lida, disputando espaço, no noticiário, na vida... 

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