PÁGINA VIRADA
Sonia Lencione

Escorre. Água escorre.

Lava-me toda.

Escorre feito cascata sobre meu corpo...

deste meu tempo de agora. 

Escolhi um tempo para esta chuva.

Escolhi este campo de trigo onde me deito.

E sinto esta chuva a escorrer por todos os tempos passados.

Por este tempo que não existe.



Esta chuva me purifica.

Me lava a alma.

Mesmo que ela não exista.

Que não exista este campo.

Nem esta exposição de minha nudez à chuva.

Mesmo que este meu corpo não exista.

Minha alma lá está e escorre tanta água.

Estou purificada... mesmo que o campo de trigo seja tão só...

uma estória contada.

Tão só uma página virada.  

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