A NOIVA PERFEITA
Daniela Schmitz

Dessa vez o namoro de Ana daria certo. Carlos merecia todo o esforço do mundo por parte dela. Ele realmente valia a pena e chegara a hora de avaliar os atos e os fatos e ver o que poderia ser feito pra esse namoro durar. Ana não era mais nenhuma menininha. Em breve tornaria-se uma balzaca e, por mais que negasse ou odiasse essa expressão, seu relógio biológico estava batendo. Por enquanto, o tic-tac ainda soava baixinho, quase imperceptível, mas era desesperador imaginar o dia em que o cuco passasse a sair de hora em hora da portinha para avisá-la de que seu tempo estava passando. 

Logo depois de marcar o terceiro encontro com Carlos, Ana sentou-se à mesa sozinha e planejou o caminho, as curvas e os atalhos que a levariam rumo ao casamento. A primeira etapa era fazer um retrospecto de todos amores, casos, amizades, paixões que vivera na vida. Pegou o caderninho e pôs-se a anotar. Paulo não gostava do meu mau humor matinal. Felipe dizia que eu não sossegava e que sempre precisava ficar mexendo, futricando, produzindo ou estragando alguma coisa. Ele fazia questão de afirmar que quieta eu não sabia ficar. Tudo bem, Ana, “controlar a impaciência”. Henrique elogiava minha força de vontade, mas detestava minha pressa para obter as coisas. Para o João eu era linda, gostosa, encantadora e grossa. Tudo porque eu mandei o dito pra todos aqueles lugares inimagináveis quando, depois de duas semanas, descobri que ele era casado, tinha 4 filhos, dois gatos e uma cachorra. O Marcelo, o homem mais bonito que já tocou neste corpinho, reclamava do meu ciúme doentio. Mas nem com marcação, monitoramento e perseguições consegui evitar que ele me traísse. Se bem que, pensando melhor, todos os ex-alguma-coisa reclamaram em algum momento do meu excesso de ciúme…

E assim, foi. Por mais de quatro horas Ana lembrou, pensou, escreveu, criou situações, treinou reações para, enfim, desenvolver o perfil da noiva perfeita. Começou anotando as qualidades que deveriam ser exaltadas e terminou com a lista dos sentimentos que ela deveria controlar. Escreveu bem grandão no final de tudo: controlar o ciúme, já que isto fora um consenso entre todos os antigos namorados. E ali surgia uma nova mulher com carteira de identidade e CPF emprestados da antiga Ana. O Carlos não ía nem perceber que ela estava diferente, eles mal se conheciam e essa era a época perfeita pra brincar de camaleão dentro da própria pele.

Ana guardou os papéis com todas as anotações de sua nova personalidade. No início, para acelerar o processo de “encarnação” da nova pessoa, deitava-se na cama e lia aquele papel todos os dias. Era uma espécie de ritual agarra-casamento. A cada sessão, ela incorporava mais e mais o seu novo perfil. 

O plano acabou dando tão certo que o Carlos pediu Ana em casamento com direito a jantar romântico surpresa, velas, flores, declarações e todas aquelas coisas melosas e grudentas que toda mulher adora, mas a maioria não tem coragem de admitir. Embora Ana tenha se empenhado para conseguir o matrimônio, o pedido chegou mais depressa do que ela esperava. E a única coisa que fez depois do pedido foi perguntar por que ele a queria como esposa. Foi aí que Carlos olhou bem dentro de seus olhos e enumerou todas as suas qualidades. As mesmas qualidades que estavam anotadas naquele caderninho. Não faltou uminha. Então ela sorriu imaginando o bendito caderno dentro a mala da lua-de-mel. E, antes do sim, respirou fundo para engolir o ciúme da mulher que Carlos tanto amava. 

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