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Beto Muniz

 
 
Antonio é feio. Só não é mais feio que um filhote de greguejé. 

Seu nome foi escolhido pela mãe que jura ter sentido muito mais perder o final da novela que as dores do parto. Pela dor sentida botou nome no filho de Antonio, pra ele nunca se esquecer que nasceu em dia errado fazendo ela perder os três últimos capítulos, que foi quando o Fagundes deu um pé na bunda da vilã e se casou com a mocinha. A mesma que sofreu apaixonada a novela inteira. 

À medida que o menino foi crescendo a mãe se desesperava por não reconhecer nele as feições do protagonista homenageado. Fagundinho não encorpou, sua adolescência passou e ele permaneceu franzino com a cara cheia de bexiga. Herança genética do pai que na noite de Porto Seguro lhe parecera lindo e pela manhã, dissipado o véu alcoólico, se mostrara esburacado feito a peste! Horror dos horrores se descobrir prenha, mas o terror maior foi se imaginar criando o filho de um desconhecido. Como em tudo na vida dá-se um jeito a mãe deu carinho e estudo pro infeliz aguardando que virasse doutor, porque feio como era, seu futuro seria virar caçoada das moças. Se fosse leso das idéias então? Passou anos debruçado sobre livros, o pobre, que de tanto ler pegou gosto pelas letras e se tornou um poeta das sombras - tudo que escreve destila tristices e solidão. 

Seus versos alcançaram o esconderijo de Das Dores, a própria cria miúda dum greguejé, que nas tristezas do poeta se viu descrita e desnudada. Com o coração zabumbando aloucado rabiscou uns versos acalentando as angústias sentidas pelo poeta. Antonio se viu lindo nos versos que a moça lhe respondia, se vestiu de coragem e saiu das sombras para encontrar a moça sob luz RGB. A beleza impressa nos escritos de um acrescentou fermento a imaginação do outro: "Sem encontros" – ela estabeleceu cortando a possibilidade de sua fisionomia causar desencanto no belo príncipe formado em sua mente. "Sem fotos" - corroborou de pronto o sapo poeta já endereçando suas rimas a deusa grega. Iludidos pela imaginação permanecem trocando alegrias, fantasias e enganos noite adentro. A solidão se rende e estica a madrugada para testemunhar o amor de dois feios se transformando em teclas e invadindo os monitores dos encantados em que assinam Apolo e Afrodite. 

Serão felizes até que uma foto os separe. 
 
 

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