NÃO EXISTE HOMEM FEIO, MAS POBRE...
Jayson Viana Aguiar

Camila e três amigas estavam naquele barzinho da moda. Ocupavam uma mesa junto à calçada: ponto estratégico para serem notadas e para perceberem todos e tudo do lugar. E nesta de fofocas, paqueras, atenção em quem acontecia e podia, foi que viram o importado, conversível e caro carro de um rapaz encostar no outro lado da rua. O moço que desce do automóvel vira logo comentário da roda de mulheres.

Adjetivos como horroroso, esquelético, chupado, anêmico, baixinho, dentuço, vesgo, careca, esquálido, malfeito, cara de limão azedo, abortado e bexiguento foram os mais brandos proferidos por elas, aliás, menos por Camila. Esta achava que aquilo que estavam dizendo tinha a única intenção de suscitar nela um desinteresse por aquele distinto rapaz, dono de um caríssimo carro, que vestia roupas de grife e que usava um relógio suíço de ouro.

Vendo sob este ângulo, rápido Camila quis passar as amiga para trás, e realmente passou: em quinze minutos já estavam, Camila e o rapaz do carrão, sentados em uma mesa a sós; com mais quinze minutos, aconteceu o primeiro beijo.

Depois daquele dia seguiu-se um namoro de dois anos recheado com muitas jóias, viagens para Europa, jantares no melhores restaurantes; claro que tudo bancado por ele que ganhava de uma multinacional quinze vezes mais que os singelos dois mil e quinhentos reais do salário de bancária de Camila.

Camila passou a responder as injuriosas qualificações que as amigas insistiam em atribuir ao namorado com as revelações de tudo que ganhava do agora noivo. Pois é, iam casar. Lugar melhor para morar ela não iria querer: apartamento enorme, à beira-mar, um por andar.

E o casamento foi coisa de nababo, tão assim que, pela primeira vez, conseguiu Camila despertar a inveja das amigas; mais ainda quando souberam que os noivos passariam a lua-de-mel no Taiti.

Mas qual não foi a surpresa deles ao chegar da magnânima lua-de-mel: ele havia sido demitido da empresa multinacional por ter feito uma operação de crédito deveras desastrada. Pior ainda foi ver o nome dele mencionado e lembrado no mercado como incompetente a ponto de não conseguir mais nenhum emprego. Daí para frente sucedeu uma série de acontecimentos como os recém-casados serem despejados do apartamento à beira-mar por falta de pagamento do aluguel. Isto mesmo: o apartamento que Camila julgava ser de propriedade do marido era alugado. A crise financeira chegou com força. E dentro de pouco tempo, e coincidentemente, Camila começou a ver que o marido que escolhera para si não era o mais maravilhoso, começou até a ver nele qualidades de feiúra nunca mencionadas numa mesa de barzinho. Supôs até que crise financeira daria para se agüentar, mas ao lado de um homem tão feio, não. Passou a incomodar-se tanto com a fealdade do marido que pediu o divórcio.

Camila voltou à mesa do barzinho. E as amigas entenderam e apoiaram Camila, afinal, tal desastre poderia ter acontecido com qualquer uma.

* * * 

Dois meses depois da separação, um advogado ligou para Camila comunicando que o ex-marido entraria com um pedido judicial de pensão alimentícia.

fale com o autor

Para voltar ao índice, utilize o botão "back" do seu browser.