CONSCIÊNCIA PERDIDA
Rita Alves

A noite caiu escura e gélida. Ventos faziam as árvores rangerem como um grito de dor. Acordei sobressaltado com o som estranho e abafado que vinha do sótão. Meu coração começou a bater descompassado, senti as veias do meu pescoço saltarem e o suor começou a descer pelo meu cenho franzido.

Fiquei estático, tentando ouvir mais algum barulho, um vacilo daquele que talvez estivesse demasiado louco para invadir minha casa. E se ele estivesse armado? Comecei a ficar confuso quanto ao que fazer.

Resolvi sair da cama e caminhei em direção a porta, um arrepio estranho tomou conta do meu corpo franzino e trêmulo. Girei a maçaneta, abri a porta e fiquei frente a frente com aquela monstruosa criatura e como se tivesse perdido a noção de tudo à minha volta, soltei um terrível grito de pavor. Consegui me desvencilhar dela por um momento e desci as escadas correndo, mas como num passo de mágica ela já estava exatamente atrás de mim e não pude evitar o confronto. A minha Consciência estava ali, não adiantava fugir. Ela estava olhando fixamente pra mim e zombando das minhas fraquezas.

Chorei de ódio, cerrei os punhos e corri até o sótão, testemunha de todas as minhas crueldades e ela, minha Consciência, foi comigo para atormentar-me ainda mais. Eu escutava sua voz rouca enumerando todos os meus erros e os meus crimes mais terríveis, sentia deleite e ao menos tempo um imenso vazio. O vazio que me impulsionava a cometer todos aqueles crimes que davam sentido a minha existência. Eu amava o que tinha de mais feio e repugnante em mim. O lado obscuro que todos insistiam em dissimular era para mim o mais belo e maravilhoso traço da minha personalidade. Com a Consciência ali, do meu lado, esses sentimentos eram ainda mais fortes e controversos, Ela seria minha próxima vítima. Tentei golpeá-la e ela sorrateiramente me cortou os pulsos.

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