JANELAS, JANELAS...
Paulo Panzoldo

 
 
Teve tempo em que bisbilhotice de janela dava crônica, letra de música e até mesmo poesia. Aqui da minha janela vejo uma esquina, mas nada acontece na minha esquina que me leve até a janela. 

A minha esquina é apenas um ângulo que, apesar de curvo, chamam de "ângulo reto". Não tem portas nem de loja, nem de bar. Não tem ponto de ônibus, muito menos camelôs, que ficam lá na outra esquina, onde tem uma avenida, que não consigo avistar daqui da minha janela.

Dizem que não havia melhor lugar para um encontro que uma esquina. Hoje, se um cara passa mais de dez minutos numa esquina é "mão na cabeça e documento na mão!!!", se não for pior: "Assalto!!!". E não havia melhor lugar pra bisbilhotar encontros e desencontros do que uma boa e bem localizada janelinha.

Um encontro na esquina não furava e não punha em risco o segredo do romance. - "Gabriel com Faria Lima". Que chifrudo desconfiaria de alguma coisa?

Da minha janela também vejo uma praça, mas, mesmo antes, ninguém marcava encontro em praça, pois era fácil arranjar uma desculpa: - "É que eu estava do outro lado, meu bem, você é que não me viu!". 

O tempo passou, a cidade continuou crescendo e chegou o celular. Adeus bisbilhotices. A janela? Foi parar atrás das grades.

O celular acabou com aquela ansiedade proporcionada pelo atraso. - "Será que ela não vem?". E enquanto ela não vinha, quanta coisa não haveria de passar pela cabeça do sujeito? Era um ponto a favor delas. Muitas não perceberam isso, mas a pontualidade feminina deixou de ser uma fraqueza. Atrasou? Liga pro celular dele.

Em compensação, não existe mais o vexame de ficar esperando o namorado na janela. Não existe mulher jogada às traças. Se o Alfredinho atrasou - e não ligou do celular -, dane-se. Ainda resta o Marcelinho, - "qual é mesmo o telefone do Marcelinho?".

Só as ansiosas, de natureza sofredora, quando marcam o encontro em casa, e não na porta do barzinho, voltam à janela a cada instante, já prontinhas, e verificam o relógio, mesmo sabendo que o cabra acabou de ligar do celular, avisando que o trânsito das marginais está parado e ele vai atrasar um dez minutinhos. Já se passaram doze e ele não voltou a ligar.

Mais difícil ainda é o cara chegar cedo demais e buzinar debaixo da janela e ficar esperando, afinal, tem celular pra quê?

Devia ser gostoso perder tempo na janela, espiando a vida alheia. Quem encontraria quem? Por que alguém seria tão esperado? Por que outro esperaria tanto?

E se fosse um primeiro encontro? Ou um encontro casual?

Outro dia li num classificado de jornal: "Mulher loira, vestida de vermelho, procura homem moreno, alto, que vestia jaqueta de couro marrom, camiseta branca e calça jeans na terça-feira à tarde. Favor encontrar-me na mesma esquina onde tudo aconteceu no próximo sábado, às 15:00 horas".

Nem um telefone, nem um celularzinho sequer, nada. Uma paixão à primeira vista, à moda antiga, e por isso fiquei imaginando, eu, de uma janela, observando um sujeito moreno, alto, vestindo jeans, camiseta branca e jaqueta de couro marrom, ansioso, esperando por uma loira, olhos verdes, seios fartos, bundinha arquitetônica, vestida de vermelho. Ele olharia o relógio, daria socos no ar, encostaria num muro, acenderia um cigarro, olharia para um lado, depois para o outro. Nada. Acenderia outro cigarro, e talvez mais outro. A espera seria ainda mais dolorida ao entardecer, mas a felicidade iluminaria as ruas quando ela, vestida de vermelho, deslumbrante, chegasse, abrisse os braços e, no meio de um sorriso maroto, corresse ao encontro do primeiro beijo.
 
 

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