ESTRANHA EXPERIÊNCIA
Vera Vilela

É uma tarde quente de verão e resolvo dar um passeio até a colina para conseguir um ar mais fresco, são 3:00h da tarde. Vou até meu local preferido no alto da colina.

Recostada a uma árvore sinto o mormaço do sol escaldante. Ao contrário a grama me da uma sensação boa de frescor e nessa miscigenação vem um delicioso dormitar vespertino. 

A tarde vai passando e fico ali admirando a paisagem e os animais que chegam para se refrescar.

Aos poucos a noite toma conta da paisagem e vejo no pasto algumas vacas dobrarem os joelhos e se prepararem para dormir. O silêncio parece tomar conta de tudo e vejo que é hora de voltar. Levanto-me, abro os braços e aspiro o ar gostoso da noite.

Começo a caminhar de volta a fazenda em passos miúdos para aproveitar este ar noturno. Estou afastada uns 200 metros da casa principal quando ouço um barulho estranho como uma onda de rádio, baixinho mas que penetra fundo em meu ouvido. Sinto-me um pouco tonta e paralisada, fico ali imóvel achando que talvez seja uma queda de pressão momentânea.

Fecho os olhos por um momento e sinto-me tontear, olho para o lado e vejo uma pessoa vindo em meu auxílio. Uma mulher me segura no braço e ombro e se oferece ajuda,aceito e lentamente retorno ao meu caminho.

Aos poucos vou percebendo um ambiente estranhável à minha volta, não há mais a vegetação, pareço estar num deserto, tudo em volta é areia, piso num solo duro como se fosse uma estrada de tijolos socados, só que eles brilham com o luar e posso vê-la terminar numa construção singular, parecida á uma cúpula de igreja.

Continuo em passos lentos, olho para o lado e vejo a senhora sorrindo, o mesmo sorriso que me encontrou, como se não tivesse outra expressão no rosto. Seus cabelos são muito compridos, não consigo ver até onde vão, sua mão é fria e molhada, seus olhos parecem sem vida. 

Chego até o que seria uma casa, uma porta enorme, talvez de ferro, a senhora empurra a porta e ela se abre delicadamente apesar da robustez que aparenta. Por instantes me tranqüilizo e imagino que se trata de um sonho, então o melhor é relaxar.

Lá dentro parece uma casa, mas tem objetos desconhecidos e enfeites estranhos. Não tem janelas é um ambiente escuro, não vejo nada parecido com uma luz, é como se a iluminação emanasse das paredes fluorescentes. Começo a sentir medo porque não acho nada familiar naquele lugar, no centro desta sala tem uma espécie de bolha plástica com um líquido avermelhado dentro, sou conduzida ate perto desta bolha.

Enquanto me encaminho na direção da bolha vejo que mais duas pessoas adentram ao aposento e ficam um de cada lado da bolha, parecem humanos, mas sua fisionomia é estática como a da senhora que me ajudou. Eles têm um sorriso igualmente sem emoção colado ao rosto e agora mais perto posso ver que seus olhos parecem na verdade um desenho plástico colado ao rosto.

Os dois se aproximam e me puxam contra a bolha com força e eu mal tenho tempo de pensar em resistir, só sinto todo meu corpo unir-se àquela bolha e reluto puxando a cabeça para trás, meu corpo quase todo já esta envolto pela bolha que me suga as pernas e braços para seu interior. Minhas forças vão terminando e sinto na base da minha nuca, uma picada rápida e uma sensação quente passar por toda a minha cabeça até em meus olhos que fecho rapidamente e sinto meu rosto afundar no que poderia ser um tipo de gelatina da bolha.

Abro os olhos vagarosamente e sinto dificuldade com o clarão que está a minha frente, aos poucos minha visão vai retornando e percebo que o clarão é a luz do sol. Estou ali sentada, recostada na árvore, sentada sobre a grama fresquinha e olhando para o horizonte.

Me assusto e volto correndo para a fazenda, chego quase sem ar e com uma dor horrível nas costas. Minha mãe me da uma caneca de alumínio com água fresquinha, recém tirada do poço e diz pra eu tomar cuidado com o sol, tem muita gente tendo insolação na região. Levanto os cabelos para me livrar do calor e suor e minha mãe se espanta, me pergunta desde quando tenho aquela mancha escura na nuca. Respondo apenas que não sei e um medo toma conta de mim.

Olho para a parede e o velho relógio cuco marca 3:00h da tarde.

***

Hoje é dia de festa na fazenda, meu filhinho faz 1 ano de idade, em volta da mesa apenas eu, minha mãe, meu pai, meus dois irmãos e o padre da cidade. Cantamos parabéns para ele e o padre rapidamente sai sem ao menos comer o bolo, já na porta se volta, se benze e sai apressado.

Meu irmão tem a infeliz idéia de pegar a máquina fotográfica, mira meu filho em pé na cadeira e dispara. Com o clarão meu filho se joga para trás e puxa a máscara presa em seu rosto deixando à vista sua pele escura e úmida, seus músculos gelatinosos ficam à mostra, seus olhos vermelhos sem pupila olham para mim e de sua boca sai sua língua reptil e começa a soltar um grunhido ensurdecedor.. 

Vou até o paiol, entro, abro a pequena jaula, pego duas cobaias vivas e as levo para dentro. Meu menino corre ao meu encontro e engole uma de cada vez as cobaias e sorri satisfeito.

Olho o relógio, são 3:00h, saio com ele e subo novamente a colina como tenho feito mensalmente neste mesmo dia, deixo-o lá e mal chego em casa, ao fechar a porta ele já esta de volta, o relógio marca a mesma hora.

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