CATA O VENTO, O TEMPO E A VIDA
Juraci de Oliveira Chaves

O susto fora violento.

A mão suspensa no ar detém o formigamento da substância. Uma marca insignificante no dorso da mão. Gritos alarmantes ecoam no silêncio do cerradão. Anna olha para o lado e vê um corpo quase sem vida a perder os últimos movimentos. O outro irmão já não tremula nem respira. Ela sente o pavor de ter o mesmo fim se não tiver socorro imediato. Grita com mais intensidade pedindo pela ajuda que não vem. Tão perto de casa e o seu apelo não a alcança. Silêncio e dor. O velho catavento cata o vento, o tempo e a vida. Desfalecia. Tudo nublado, embaçado. Até os girassóis perderam o brilho. O sol se cobria com uma névoa densa quase no final do seu curso. Mesmo sem forças, Anna retira o soutien e faz uma amarra no antebraço. Enxuga o suor da testa. Ampara a cabeça do menino paralisado. Uma pausa para um suspiro longo. Um beijo leve na face já amarelada. Vê o último suspiro do irmão. Sente medo, se recrimina por ter permitido a correria, as brincadeiras e o distanciamento dos garotos, dela. Era sempre assim, corriam na frente para fazerem a coleta dos ovos de galinha, no ninho, toda volta de escola. A mãe os esperava com o sorrisos largos. Mas... eles não chegavam, demoravam muito. Foi atrás. Mal pôde acreditar no que via e ouvia da filha, em sussurros. Desespero! Uma cascavel fez sua rodilha dentro do ninho escuro, daquele cupim. Cupim debaixo do enferrujado catavento que já não mais exercia sua função.

A cada mão que penetrava no oco, saía com a cicatriz pequenina, impregnada de veneno. As crianças não perceberam o perigo que enfrentavam. Picadinhas sem dor e sem sangue. Mortíferas.

Como se não tivesse nada com o fato, a mãe vê a cobra sair do ninho, deslizando sobre a terra seca, sumindo entre as moitas, sob suas pragas. Pragas que não trazem vidas de volta.

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