CONTRA OS FATOS, NÃO HÁ ARGUMENTOS
Virgínia Circhia Pinto

Separação de casais passou a ser fato corriqueiro e ninguém mais se espanta com uma notícia dessas, mas quando a coisa acontece dentro da sua casa é como se sua vida tivesse virado no avesso. Depois de algum tempo, e muita dor, se aceita o inaceitável. A vida é assim. As perdas são dolorosas, mas depois de achar que nunca mais será a mesma, você acaba se refazendo e tem grande chance de ser, de novo, feliz. 

Primeiro é a ausência física. O barulho da chave na porta da frente, todos os dias naquele mesmo horário, os passos e a saudação afetiva que você ouviu um dia, não existem mais. Por seguidos dias você pensa que ouve o mesmo ritual, mas só existe o silêncio. Lentamente você percebe que perdeu o controle da vida dele e um certo dia você se convence de que a porta não irá mais abrir naquela hora, que ele não vai mais entrar na sua casa e que ele está, definitivamente, saindo da sua vida.

No início você é tomada por uma sensação de alívio. Alívio da dor de não se entenderem mais, de não se amarem mais como antes, de terem se perdido em algum momento do caminho que imaginavam seguir para sempre, e a dor de ter perdido aquilo que mais acreditou na vida, toma conta de você. São dias difíceis. O mundo continua seu movimento normal mas você está no olho do furacão. Os que estão ao seu redor e te amam, se preocupam, ligam, perguntam, calam, acolhem, mas você está perdida dentro de si mesma e de seus sentimentos, de sua dor e de sua infinita tristeza. São momentos em que se vive como numa montanha russa. Há dias em que você acorda ótima, no topo do mundo no controle absoluto de sua vida. Em outros, levantar-se da cama é o exercício mais difícil que você já fez um dia, e olhar para cada nova manhã dá a amplitude do vazio que tomou conta de seus dias.

E as noites? Ah, as noites... Há aquelas em que você acorda assustada, com um sentimento de abandono como se nada mais te protegesse e sua alma está sozinha, abandonada no canto do mundo, envolvida por todos aqueles sentimentos infantis de falta de proteção e carinho. Inúmeras noites virão, e cada uma poderá te reservar surpresas. Ao final de algum tempo, você se acostuma e começa a gostar de ter a cama toda para si, de poder ver tv livremente, de ler o tempo que quiser e apagar o abatjour quando bem entender. Seus sonhos começam a dar sinais de que tudo está passando e você sente que um dia voltará a ser feliz.


A vida segue alternada por golpes de alívio e saudade. A indignação de tudo não ter acontecido conforme programaram passa a ser sua companheira no dias em que você visita o fundo do poço mas também vai sumindo feito fumaça, a cada novo amanhecer, dando lugar à esperança de dias melhores com a dor afinando, sumindo, e você renascendo.

Surge uma fase de novos amigos por que os antigos eram quase todos casados, e você sente a necessidade de ver outros mundos, outros desejos e pode até sonhar com novos amores. Devagar, bem devagar, a luz começa a tomar conta de sua vida novamente e viver passa a ser, de novo, uma boa aventura.

Alguém pergunta em que momento vocês começaram a se separar. Não se sabe dizer o momento exato, mas sente-se que faz tempo, muito tempo... Perguntam também quem foi o responsável pela ruptura. Não teve um culpado nem uma vítima, houve um desencontro. Em algum momento se separam afetivamente, mas ainda tentaram agregar os valores comuns que possuíam, mas não conseguiram, o elo estava rompido, este é o fato e contra ele não há argumentos.

"Nada do que foi será, de novo do jeito que já foi um dia, tudo passa, tudo sempre passará. A vida vem em ondas, como o mar, num indo e vindo infinito..." Você já pode voltar a cantar esta canção, pois independente e alheia a tudo o que se passa dentro de seu coração e sua mente, a vida segue em frente e seu ritmo vai retomando a harmonia e cadência que sempre teve. 

Viver é uma escolha individual e única. Depois de uma grande dor, você pode escolher entre ser mais forte ou fraca, melhor ou pior, alegre ou triste, e pode incondicionalmente, escolher entre reconstruir sua vida ou desistir dela. E como dizia um amigo nos momentos de maior aflição:

- Não se desespere, tudo vai passar e você vai sobreviver. A vida começa depois do primeiro divórcio... 

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