BORBOLETAS
E LAGARTAS

Ubirajara Varela

O nome dela era Laís. Competente secretária de um consultório médico no centro da cidade. Nunca se atrasara para o trabalho, quanto mais faltar. Dedicada, esforçava-se para melhorar cada vez mais, estabelecendo metas a serem alcançadas. Investia na carreira, fazendo todo o tipo de curso que aparecia, desde computação, até excelência em atendimento a clientes.

Foi exatamente esta a impressão que ela me causou, quando a vi pela primeira vez. Eu estava com uma terrível dor fazia dias e procurei o primeiro gastroenterologista da lista. Ele também parecia um bom profissional. Prescreveu-me alguns remédios que aliviaram o meu incômodo momentaneamente.

Havia no consultório um quadro de avisos com um provérbio chinês: “se queres ver as borboletas, deves suportar as lagartas”. Fiquei intrigado com aquilo, acho que fiz alguma piada estúpida na hora. Laís riu educadamente.

Mas não foi só por educação. Ela realmente simpatizou comigo. Tanto que, dois dias depois, estávamos saindo para jantar. Um restaurante simples, perto do consultório.

Pouco tempo depois, já estávamos namorando. Nos víamos quase todos os dias, almoço, jantar, café da manhã, isso tudo, quando não passávamos a noite juntos.

Aos poucos, ela foi se mostrando. Sua real personalidade. Era uma pessoa obsessiva, neurótica, vivia se menosprezando, rancorosa, não perdoava nada. E o que era pior, começou a descontar seus problemas em cima de mim. Tentei ajudá-la, encaminhando-na para um bom profissional. 

Com os remédios e as sessões do psicólogo, não demorou para que Laís sentisse uma melhora. Uma certa liberdade, sensação nunca experimentada antes de não dever nada a ninguém. Passou a sorrir mais, até o seu caminhar mudara, estava mais sensual.

Porém foi temporário. Achando que estava curada, abandonou o tratamento e os problemas retornaram. Parecia que uma fúria se abatera sobre ela. Ou, melhor dizendo, sobre nós. Agora eu era culpado por tudo de errado em toda a sua vida.

Cansado disso, a única solução que encontrei foi abandoná-la. Não de uma hora para outra. Ainda fiz muito para ajudar Laís. Conversei pessoalmente com o psicólogo a fim de receber alguns conselhos, tentei preencher os horários livres dela com atividades relaxantes, comprei roupas novas. Fiz de tudo, sem sucesso.

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Faz algum tempo que não nos vemos. Às vezes, tenho saudade dela. Laís era uma flor de pessoa, carinhosa, atenciosa, tirando o seu problema. Poderia ter dado certo. Mas também não posso ficar me martirizando por uma pessoa assim. Ela era competente no trabalho, mas para lidar com sua vida pessoal era uma negação. Já o médico, não posso afirmar se tinha habilidade com relacionamentos afetivos, mas posso garantir que era um péssimo profissional. Minhas dores continuam até hoje.

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