ELAS
Iosif Landau

A de calças entrou primeiro, sentou-se do lado direito, a de vestido no outro canto.

— Pra onde? perguntou o jovem motorista, olhos pregados no espelho... nada mal, talvez dê samba, pensou.

Vestido falou:

— Pega a direção da Zona Sul.

O motorista arrancou sem pressa, olho ainda no retrovisor, a de calças sorria, a mão a caminho do canto oposto, a de vestido se encolheu, a mão parou o movimento.

— Amigas?

— Não muito — vestido riu — távamos atrás de azaração. Não pintou nada que prestasse. Só coroa barrigudo, caras de porre, detesto cara porrado, dá muito trabalho, nenhum sujeito com aquela ginga de macho, olhar de promessa, com aquela química, cheiro de tesão, tu sabe o quê e isso? Não sabe não, tu não é mulher. . .

— Sei, sim! Quando tô a fim sinto cheiro de xota, mulher com tesão tá molhada, dá pra sacar mesmo quando tá perfumada — fingiu fungar — tô sentindo agora.

— Tá querendo me engrupir? Todo motorista é broxa, os colhões sempre apertados nas calças... bem, não vem ao caso... ela tava lá, encostada no bar, puxamos conversa, dois, três drinques. Resolvemos sair pra outra — falou calças.

— Aonde?

— Não é de sua conta, cuida da direção e tira o olho dessa merda de espelho.

— Acha que devo ir ao apartamento dela? — perguntou vestido.

Que porra de pergunta... será que ela tá a fim de mim? Se eu fosse macho mesmo enxotava a outra e...

— Sei o que passa por essa tua cabeça de merda — falou calças — não se meta a besta!

O carro deixou a Rio Branco, pegou o aterro.

— Não liga pra ela — falou de repente vestido — é nervosa. Na casa dela até o cachorro toma Prozac.

O motorista ouviu um tapa.

— Merda, tu fala demais, vai contar tudo pro cara?

O carro parou.

— Podem saltar. Não precisam pagar a corrida.

Ouviu risadas, uma dela falou:

— Teu nome, cara?

— Não interessa. Não quero encrenca. Nada de porrada.

— Tu não entende nada de nada — falou calças — Vamos em frente e deixa de frescuras.

O carro continuou... ela tem razão, melhor ficar na minha, mulher é bicho doido, sapatão então... vestido beijou o rosto do rapaz, afastou-se.

— Ela quer coisa comigo — falou rindo — o quê tu acha?

— Eu diria que tem bom gosto.

O rapaz olhou pelo retrovisor, a de calças aproximava-se da outra, o beijo foi curto, indeciso. Afastaram-se.

— Tenta de novo... talvez esquento ela pra você.

Vestido colocou a cabeça no respaldar do assento do motorista. Ele movimentou o pescoço sem tirar os olhos da pista, errou o beijo, a mulher jogou-se para trás.

— Otário! O quê você mais gosta em mulher? — falou calças.

— Bunda — respondeu sem hesitação.

Risadas.

— Falei ou não falei? São todos uns tarados — falou calças — Homens são porcos. Não apreciam a delicadeza das curvas femininas, o contorno das coxas, o colo, os seios, as carícias, mulher gosta de carícias, dedos, lábios na zonas erógenas... tu sabe o quê é isso, garoto? Aposto que não. Só mulher conhece mulher... até o calcanhar bem trabalhado desperta o tesão... babacas!

As garotas abraçadas.

Vestido gritou:

— Pára aqui! perto do gramado, debaixo do poste.

— O quê foi? Vai saltar? Aqui é perigoso — falou o rapaz.

Mais risadas.

— Tu é uma besta mesmo — falou calças — ela vai se mostrar pra gente, vai dar umas piruetas, vai levantar o vestido, coxas pra eu, bunda pra tu, talvez com sorte ela mostra até os peitinhos. Bota o teu rádio pra tocar, bem alto.

O carro estacionou, a garota saltou, no gramado iluminado parou por instantes, sorriu debochada, depois desfilou, indo e vindo, volteios, coxas apareceram, vestido levantado a la can-can, calcinha diminuta, bunda desenhada a compasso, passos de dança, acompanhou o ritmo da música, ensaiou movimentos de strip, mostrou o seio esquerdo, mexeu no mamilo, mostrou a língua, voltou.

— Que tal? Gostou? — perguntou calças.

— Uma bunda e tanto — respondeu o rapaz, a voz rouca. Pigarreou: — Que tal a gente. . .

As duas se entreolharam.

— Só se fizer algo — falou a de calças

— O que? — esperança na voz

— Ele até que é boa pinta, não acha? — falou a gostosa

— Para homem até que atrai, o que sugere?

— Ele me lembra de Travolta 

O rapaz levantou um pouco mais a cabeça:

— Me disseram que de perfil sou como Elvis.

— Tira a camisa e as calças, queremos ver seu físico — falou a de calças.

— Precisa?

— Sim, lógico, apenas a cara não serve, e faça devagar como num palco.

O rapaz obedeceu, ofegante.

— Nada mal — falou a gostosa - para quem fica o dia inteiro sentado.

O rapaz estufou o peito:

— Faço musculação, deu pra sacar? Olha meu abdome, todo sarado.

— Vira, abaixa a cueca quero ver tua bunda, se for mole nada feito.

Ele hesitou, mas obedeceu, esperou.

— Ei, quanto tempo vou ficar assim?

Não ouviu resposta, mas escutou o carro dar partida, virou-se apressado, viu a de calças no volante, a gostosa rindo mostrou o seio, ouviu:

— Babaca!

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