CHÁ COM CERA
ou VIVA AS ESTETICISTAS

Patricia Zayat

- Será que essa cera é comestível? 

Esse foi o primeiro pensamento de Cláudia quando, enfim, desistiu de remover da panela todos os resíduos da cera para depilar. Logo a panelinha que o pai usava para ferver a água do chá preto diário! O detalhe é que os pêlos continuavam no mesmo lugar. Ou seja, não dava nem pra fazer a linha “eu-lavo-louça-sim-mas-olha-que-beleza-de-pernas”. Jurou que nunca mais ia repetir aquilo. Depilação agora, só com profissional. 

Filha de uma mulher sem grandes vaidades, Cláudia sempre viveu às margens do universo de pinças, alicates e cremes femininos. Não fazia a sobrancelha, não tirava a cutícula e acabara de descobrir que derreter cera era muito mais complicado do que pensava: em banho-maria! E a dor então? 

O máximo da vaidade da moça se resumia a usar um ou outro batom, encomendados em revistas de produtos de beleza. E só. Às vezes, ficavam largados na cômoda. Era comum que seus cremes passassem da validade. Conhecia alguns truques caseiros para dar brilho aos cabelos e manter a pele sempre linda mas nunca os executava. Acompanhava de perto as novidades do mundo da cosmética. Sabia dos lançamentos de shampoos, condicionadores, hidratantes. Visitava regularmente a seção de perfumaria das farmácias. Lia editoriais de moda. Comprava bijuterias com as colegas do trabalho. Até pensava em pintar o cabelo. Não tinha coragem, é claro.

O que faltava à Cláudia na verdade era persistência. Faltava aquela disciplina diária, semanal ou mensal para começar um tratamento sério em casa. Nunca respeitou as quartas e os domingos – dias que estabeleceu para esfoliar a pele. A loção adstringente se acabou porque o calor evaporou todo o álcool do produto e não propriamente pelo uso. E sempre que olhava o relógio já não havia mais tempo para escolher um brinco que combinasse com a roupa – tinha uma caixa cheia deles! Era sempre o brinco da semana, às vezes, do mês. 

O caso é que Felipe de vez em quando ligava. Nessas horas Cláudia acreditava em tratamento de choque. Quase um dia inteiro se cuidando, escolhendo a roupa, olhando o relógio. Ainda que fosse pra terminar a noite suada, descabelada e exausta.

P.S.: Sendo essa história em parte verídica, a saída de “Cláudia” foi comprar uma outra panelinha para o pai. 

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