NÃO TEM GRAÇA, NENHUMA GRAÇA
Míriam Salles

Caramba! Que droga de final infeliz. A mocinha podia ao menos ter ficado com o mocinho em vez de morrer. E aquele velho? O bonzinho que só falava coisas sábias? Tinha que se acabar naquele penhasco?

Puxa vida, não é sabido que os bons sempre acabam bem no final? Isso é lei. Lei não escrita, mas é lei. Gente boazinha acaba feliz. Gente má acaba na cadeia, debaixo de um carro ou prensada numa máquina de moer ferro. Gente boa, não. Gente boa acha dinheiro onde não tem. Gente boa ganha de presente uma herança inesperada só porque um dia deu um copo de água para um mendigo que passava na rua e que na verdade era um milionário excêntrico. Gente boa arruma emprego de secretária e ganha cargo de amante com direito a Rolls Royce e férias nas Bahamas.

Gente ruim é que é obrigada a ficar trabalhando feito moura torta com ervilha nas costas. Gente ruim é quem, no final, recebe todos os olhares de desprezo, mesmo que durante o enredo tenha sido invejada.

Não, não e não! Nada de letras miúdas. Nada de parágrafos nem cláusulas adicionais. Me chamaram e eu vim, acreditando que o mundo era de e pra gente boa. Agora eu quero a parte que me cabe. Quero o final feliz arrematado com a lua e as estrelas. Nada de lua pintada de amarelo no cenário porque agora eu acordei, li as notas de rodapé e descobri que me enganaram. Pois vou a luta. Vou em busca do meu pote de arco-íris cheio de bondade. Vou entrar com recurso, vou fazer piquete; vou lutar pelo meu direito de ser boa e exigir a indenização do final feliz.

Não!

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