CRÔNICA SELENITA
Francisco Pascoal Pinto de Magalhães

 

Outro dia vi da janela do meu quarto um quarto crescente no céu cinza de sampa. Sim, era dia ainda, coisa de cinco e meia da tarde. Estrelas, porém, não haviam - também é pedir muito - naquele céu; e se haviam não as vi. Mas em compensação, havia um baita de um dirigível flutuando lá encima: não um zepelim prateado como aquele da música do Chico; não um objeto voador não identificado como aquele que uma modelo, famosa capa da Playboy e madrinha de bateria viu neste mesmo céu pilotado por homenzinhos verdes que tinham a missão de sondar se havia inteligência nestas paragens; e que provavelmente frustraram-se - onde já se viu viajar 800 mil anos luz por nada?! - ao avaliá-la por um método de aspiração telepática de pensamentos. A perda só não foi total porque, como prêmio de consolação, como sempre acontece com turistas, ganharam o direito de se empapuçarem de caipirinha e a feijoada numa barraca de praia que aceitava desde francos haitianos a dólares do Brunei, passando por passes de ônibus da prefeitura de Diadema, conchas malaias e dinares libios.

Voltando à lua, lembrei da minha infância povoada de nomes como Sputnik, Soyuz, Laika, Gagarin, Apolo 11, Armstrong, Dona Dayse... Dona Dayse? Com assim Dona Dayse? ! Porque era a minha professora na terceira série e vivia dizendo que eu vivia no mundo da Lua. Com ela aprendi por exemplo que os índios chamam a lua de Jaci. Havia uma moça com esse nome na minha rua. Acho que lhe deram esse nome porque ela tinha o rosto redondo, cheinho, que nem uma lua cheia.

Essa lua que vi no céu outro dia, vez por outra costuma dar o ar de sua graça. Ela continua dando voltas tímidas ao redor da Terra, cuidadosamente, sem se aproximar muito para não influir mais do que deve nas ondas dos surfistas, no calendário dos agricultores, no mênstruo das meninas, nas minhas melhores lembranças.

 

fale com o autor

Para voltar ao índice, utilize o botão "back" do seu browser.