LOUCA VARRIDA
Adriana Vieira Bastos


Assim fôra tachada pela filha, ao responder tranqüilamente com um não, a pergunta que esta havia lhe feito.

Não! Caso fosse premiada e pudesse escolher, não trocaria São Tomé das Letras por uma semana grátis no glamuroso Club Med, na Ilha de Itaparica, na Bahia...

Só podia estar pirando! - Dizia a filha com o olhar atônito e indignado por não compreender a sua modesta opção.

Para outra amiga, era considerada, no mínimo, sem criatividade. Com tantos outros lugares tão lindos quanto, por que, nas raras oportunidades livres que tinha, insistia em fixar-se neste lugarejo sem a mínima infra-estrutura?

Até uma certa malícia sexual sentiu na fala de uma amiga mais próxima. O que tanto havia em São Tomé que a fazia aumentar cada vez mais a freqüência de suas idas? Algo especial estaria esperando-a no topo daquela montanha?

Outros achavam que devia fumar todas, pois o lugarejo era conhecido como o paraíso das drogas, dos bichos-grilos e dos loucos em geral.

A mãe, então, não tinha dúvidas. Não era louca varrida, era louca de pedra mesmo! Não levava em consideração a sua frágil saúde e a falta de condições do lugar, caso necessitasse de atendimento médico.

Conforme prestava atenção nos comentários, lembrou-se de suas primeiras viagens e do quanto quis compartilhar com as pessoas a magia e o encanto do lugar. Lembrou-se do quanto vibrava ao contar suas experiências e do quanto, a cada vez que retornava, deliciava-se com a nova surpresa que o lugar lhe reservava.

No entanto, percebeu com o passar do tempo que, quanto mais falava, menos a compreendiam. Mais louca varrida era considerada. Rindo, chegou até a pensar na possibilidade do seu Cardiologista, homem cético, frio e racional, considerar razoável a sua transferência para outra área do hospital - a Psiquiatria.

Por isso parou de falar!

Não iria mais se preocupar com o fato de ser indevidamente interpretada. Até porque percebera que, cada fala, cada revolta, cada indignação, malícia ou preocupação, demonstravam, na realidade, a subjetividade com que cada um encarava a sua experiência.

E, subjetividade por subjetividade, optou pela sua própria. Só ela sabia o que tanto via de magia e mistério naquele lugarejo. Mas, com uma coisa era obrigada a concordar - estas falas desencontradas a deixavam louca! Louca de vontade de voltar para lá...

E quanto a filha, para encerrar a discussão, mostrou-lhe que dificilmente seria agraciada com o tal hotel em Itaparica, portanto, era uma perda de tempo estarem se estranhando por um dilema inexistente...

 

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