LAMENTO
Marco Britto

A Acauã chorou de cima do pé-de-pau.
Chorou seu canto agourento no silêncio do verão. O canto triste se espraiou
pelos cantos da tarde lenta.
Um lamento tísico chamando a seca pra tomar conta do sertão.
Os dias, os dias todos - meu Deus! - arrastados ..., de silêncio e vácuo. O
estradão cavo. Galhos rugosos, retorcidos e vazios.
A falta de vento, de sombra.
O angico pregado no chão do barro rachado, açoitado ? coitado - pela
inclemência do sol.
A Jurema servindo de pantalha para a cascavel.
A cascavel sonhando com a fogo pagô e o diabo da rolinha, lá do alto!,
gorgolejando a tristeza da caatinga.
O calango-cego, num banho imaginário da cacimba esturricada. Seus olhos
cegos pregados num céu de doer.
Êta terrinha rica! Rica de bicho, de chão e tristeza...
O vaqueiro, este pobre coitado, num tem nem mais o que fazer. Perdeu seus
bois, a garrotada, e a filharada debandou com medo de também morrer. Vai
deixando sua vidinha. O seu nome sendo esquecido, nas quebradas do sertão.
Sai co'a mão na frente, outra atrás, sem levar nenhum tostão. Seu aboio?
Segue atrás: Ei, gado, oi boi... Sacudido em cova rasa , fica a lembrança de
seu cão.
E na tarde de silêncio da cantiga e do lamento do mais novo retirante.
Os que ficam nunca mais ouvirão o cantar do seu irmão:

            Tengo,lengo, tengo, lengo

              tengo, lengo, tengo

                Ei, boi, ô boi...

 

fale com o autor

Para voltar ao índice, utilize o botão "back" do seu browser.