DEPOIS DO AMOR
Vic Laurel

 

– Foi bom pra você?

Ele era o Sr. Clichê. Tudo bem agüentar uma pergunta daquelas quando ele a fazia em tom de brincadeira, talvez até uma ou outra vez a sério, afinal, numa relação de doze anos qualquer um acaba se acostumando com os defeitos do outro.

Mas não naquele dia, não no aniversário de casamento, aí já era demais, e ela sabia disso. Feita a pergunta, ele a olhava displicentemente, com o cigarro aceso segundos antes na boca e a expressão de quem espera uma resposta. Ela não duvidaria se ele sugerisse, nada sutilmente, que talvez devessem comprar uma cama redonda com barra de cetim prateado para colocar em casa, ou quem sabe um frigobar com guaraná e champanhe. Na verdade, ela torcia para que ele falasse alguma estupidez assim, porque então ela teria um motivo bastante compreensível para agredi-lo fisicamente.

O marido continuava a olhá-la fixamente, um pouco mais sério. Entre uma e outra tragada, afastava o cigarro da boca, soltava a fumaça lentamente e mastigava os próprios lábios. Completamente irritante. Devia passar por sua cabeça que a mulher estivesse extasiada com seu desempenho e, por isso, demorasse a responder. Mal imaginava que “extasiada” era uma palavra que não constava no vocabulário dela já havia algum tempo.

Ela queria ser gentil, afinal, eram suas bodas: queria dizer a ele que a noite fora maravilhosa, que tinha sido bom para ela, como todas as vezes; queria falar que uma cama redonda com barra de cetim era tudo que ela podia desejar, mesmo que eles não morassem num bordel e que houvesse crianças em casa; que um frigobar com champanhe e guaraná e até mesmo uma lata de catuaba selvagem não seria uma má idéia. Mas, depois de doze anos, ela ainda era obrigada a ouvir, em troca de alguns minutos de péssimo sexo impessoal, o cara do lado perguntar se “foi bom pra você”.

– Não, não foi.

O cigarro caiu da boca dele e a cara de surpresa ficou imutável enquanto, com a mão, ele dava tapinhas rápidos tentando evitar que aquilo começasse um incêndio. De repente, ela se levantou indignada e arrastou o enorme lençol em direção ao banheiro. Lá de dentro, antes de bater a porta, gritou:

– Espelho no teto, também, você já quer demais!

 

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