LUVAS E LINHA
Ubirajara Varela
 

Virou lugar comum aqui em casa usar essa expressão: Luvas e Linha. "Tudo são luvas e linha". "Quem quer encontrar algo, procura com luvas e linha".

Ninguém sabe ao certo como ela surgiu, nem o exato significado. Sabemos sim empregá-la com sabedoria popular, como um dos muitos conhecimentos que nos foram passados através da oralidade, de avó para mãe, de mãe para filhos, de filhos para netos... Dando vazão ao meu ímpeto investigativo, resolvi procurar a origem do jargão familiar.

Hierarquicamente, fui buscar nos mais antigos. Nas primeiras águas da fonte genealógica a que tive acesso. Entrevistei um, proseei com outro, dialoguei com um tio-avô, argumentei com um primo de segundo grau. Várias investidas semelhantes, e nada. Esforços seguidos em vão. Ninguém identificou o significado nem tampouco o nascimento de um ditame tão eloqüente. Acrescentaram alguns novos usos para a expressão, mas não a elucidaram decerto. Os poços de erudição que eu tanto privilegiei desde a tenra infância não souberam iluminar uma questão tão simples. Fiquei um tanto frustrado.

Cá com meus botões, intrigado e obcecado pelo esclarecimento de uma dúvida cada vez mais fisiológica, epidérmica, fui buscar na internet a solução para o meu problema. Dizem que o dicionário é o pai-dos-burros. A internet, bem mais ampla, hipertextual e multimidiática, seria talvez a mãe de todos: dos cultos e dos ignorantes. Pesquisa terminada: nenhum resultado encontrado. Mais frustrado ainda, deixei a questão adormecida por uns tempos.

Ontem, conversando com a secretária de meu avô, ouvi a expressão novamente quando o interfone tocou.

"Quem é?", perguntei.

"É a sua tia Lu. A Lu Vasilhinha", ela disse.

Na cabeça entra, na cabeça ativa (parafraseando o poeta do mundo hemp). No ata-e-desata da mente, refiz o trajeto algumas vezes até chegar onde eu queria: Lu Vasilhinha, LuVasilinha, Luvas i Linha, Luvas e Linha. Eureka! O ovo de Colombo! Simples assim.

Para quem não sabe, minha tia Lucília, a terceira filha de meus avós maternos, também conhecida por Lucilinha, ou simplesmente Lu, tem um hábito de ajuntar vasilhas, taplewares, coisinhas de utilidades mil, para próprio uso e deleite. "A Lu vive guardando as suas vasilhinhas", dizem os invejosos.

Acho que é assim que nascem as maiores sabedorias e inspirações. Do corriqueiro, do usual, do dia-a-dia, do todo-o-dia, a cada manhã e em vários pôres-do-sol. A sabedoria surge da simplicidade que nos rodeia. E eu, com toda humildade, agradeço:

"Obrigado, dindinha."

 
 

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