NA MEDIDA CERTA
Bruno Pessa
 
 

Quando venho ao teclado para soltar os dedos, acabo dando pitaco em temas conhecidos só de ouvir dizer ou obtendo conclusões da minha imaginação calcada no que penso ser factível. Mas sobre saudade, posso dizer que acumulei alguma bagagem. Aos 13 anos, deixei amigos e lembranças de infância na mudança da família. Com 18, quem ficou foi a família, depois do ingresso na universidade e na vida paralela ao domicílio oficial. Grau devidamente colado, à família voltei, porém o namoro ganhou força e vem perseverando com bravura diante das investidas dela, de novo, a saudade.

Deixemos claro que não vejo saudade como tristeza por perder de vez o passado. É a falta advinda da ausência de quem veio, marcou presença e por alguma razão se foi ou, em alguns casos, manteve-se na mesma enquanto eu me desloquei. Curioso notar que sob certo aspecto reclamo de barriga cheia, pois mais passei pela vida das pessoas do que o contrário, tanto monótono e deprimente, como o poste que vê diferentes pessoas se locomoverem sempre naquela calçada. Talvez por isso eu encare sorrindo minhas saudades.

Não que a saudade não inspire uma ponta de frustração, pelo filme que a tela da memória jamais voltará a exibir. Entretanto, se eu sinto falta de alguém, então a presença do dito cujo fez bem a mim, ou seja, a saudade apenas existe porque a felicidade já esteve conosco, e pelo menos sobrevive nas recordações gostosas como o docinho no meio da tarde. Portanto, a saudade prolonga nosso bem-estar. Confortante e saudável, não é?

Tudo bem, mas como lidar com as perguntas da visão, nosso sentido mais aguçado pela saudade que insiste em procurar, mesmo à meia-luz, a pessoa que não está mais ali do seu lado? Ausência física é uma adversária de respeito, nem sempre batida pelo souvenir que guardamos, seja a foto do abraço ou o cartão de aniversário.

Nessas horas, convém apelar à racionalidade ligeiramente favorável ao lado masculino, cronometrando a saudade até que a sã consciência refresque a idéia de que o rio nunca é o mesmo e temos de optar com cautela entre seguir o fluxo ou tomar um afluente. Em outras palavras, é preciso se concentrar nos degraus adiante para não hesitar na subida e cair da escada, carregando somente a saudade que couber nas costas, já que, como demonstrou o vovô Newton, todo peso sempre pende para baixo.

 
 

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