DOCE MENTIRA
Daniela Fernanda
 
 

Ela trabalhara em casa o dia todo. Passara aspirador no carpete, tirara o pó dos móveis, trocara os lençóis da cama, colocara a colcha nova e deixara o banheiro um brilho, com o famoso cheirinho de pinho. Esticara o pano do sofá, trocara a toalha de mesa, perfumara o ambiente e espalhara flores em pontos estratégicos da casa. A cozinha ficara tão perfeitamente organizada, que agora parecia ter saído da capa de uma revista especializada.

Fora ao supermercado, fizera as compras para o jantar com cuidado. Escolhera o que encontrara de melhor para a entrada, e o que havia de mais requintado para o prato principal. Enfrentara a fila do mercado com paciência e também o trânsito intenso durante o trajeto de volta. Acabara chegando em casa mais tarde do que supunha, e agora ensaiava uma corrida contra o tempo.

Tomou seu banho, mas ainda que tivesse pressa, não poupou minutos ali. Aproveitou para relaxar um pouco, sentindo a água tépida bater-lhe no corpo, usou sabonete líquido esfoliante, com fragrância de rosas, e lavou os cabelos com xampu de leite. Ao deixar o box, cuidadosamente passou creme no rosto e perfumou-se.

Foi para seu quarto e passou a envolver-se com a etapa que acreditava ser a mais árdua daquele dia. Abriu as portas do guarda-roupa e não conseguiu encontrar nada. Como a moça da propaganda, sempre achava que não tinha o que vestir. Neste processo perdeu minutos preciosos, até que finalmente encontrou alguma coisa que lhe pareceu perfeito para aquela noite. Tentou vestir-se, mas a roupa já não servia mais. Quase teve um ataque de nervos, primeiro por constatar que engordara no mínimo quatro quilos, depois porque teria que recomeçar o processo de busca. Controlou-se, conseguiu não chorar e agora com muita pressa, revirou as roupas que tinha até encontrar alguma que já não era tão perfeita, mas pelo menos parecia adequada.
Vestiu-se com tanta rapidez que começou a transpirar. Teve que ligar o ventilador para dar os retoques finais a sua produção. O último passo era passar o batom. Escolhida a cor, preparava-se para aplica-lo quando a campainha tocou. O coração disparou, mas ela se manteve ali diante do espelho, ignorou a aceleração cardíaca e concentrou-se na aplicação delicada do batom.

Passou pela sala, colocou um cd romântico para tocar e desligou o interruptor principal, deixando o ambiente à meia-luz, para dar um toque a mais naquela noite especial. Dirigiu-se lentamente à porta, e tentando transparecer uma calma que não sentia, abriu-a. Pode ver então o seu esperado convidado, sua paixão.

- Olá! Cheguei cedo?

- Não. Bem na hora combinada.

- Tu estás linda e a casa também com as flores e tudo mais. Dei-te muito trabalho?

- Imagina, nenhum!

 
 

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