OH, QUE SONHO DE VALSA!
Eduardo Prearo
 

--- Dois sonhos de valsa por um real! Dois sonhos de valsa por um real!

--- Ah, eu quero um.

--- São cinquenta centavos, senhor.

--- Tá bom, mas vou lhe dar tudo em moedas de um, pode ser?

--- Não, não tô pegando mais.

--- Como "num tô pegando"? Se se falta um centavo para a condução, não dedixam passar.

--- Vadio.

--- O quê?

Mauro Barney ficou sem o bombom, pois tinha no bolso somente moedas de um centavo. Na verdade o que ele desejara mesmo era ter dançado uma valsa com a vendedora. Voltou calmamente para o quarto onde vivia e dormiu. Sonhou um sonho estranho: em um salão imenso, sem móveis, onde a art-noveau se destacava, Mauro Barney dançava maravilhosamente bem a valsa com Maria Antonieta. Mas de súbito o salão foi invadido por cascavéis vermelhas. MB acordou assustadíssimo, e como ainda era sábado, decidiu que não faria nada. Ouviu, então, um barulhinho vindo do corredor. Certamente que era a mulher da limpeza. Ela parecia limpar e limpar o mesmo corredor o dia todo. Pensar que ela era uma espécia de vigia seria insanidade, seria mentira, mentira, mentira. Em pleno século vinte e um e pensando em vigilantes de moralidade? Por que não pensa em vigilantes do peso? E o que há de mal alguém ter fixação por um corredor?

Amigo, amigo, talvez só Jesus. Mauro Barney dava a impressão de que não tinha forças nem para trabalhar e nem mesmo para comer. Isso é triste. Dureza desgraçada era para quem era mole. No lusco-fusco, Mauro Barney foi ao parque, sentou-se em um banco. Depois, com medo, caminhou um pouco e sentou-se em outro banco ao lado ded uma senhora de uns oitenta anos de idade.

--- Como vai?

--- Bem. E a senhora?

--- Senhora não, você, por favor. Ah, eu vou bem, obrigada.

--- Qual sua graça?

--- Ah, nem tenho mais nome. Pode me chamar de Sofia. Sou aposentada. Estou mais pra lá do que pra cá.

--- Eu também. Você já foi para a Europa?

--- O quê? Mas é claro que sim. Vivi dez anos em França. Depois que enviuvei, voltei por causa da saudade.

--- Que horror!

--- Horror por quê? Ah, hoje em dia as novas gerações não sentem mais saudade. Vamos até minha casa?

--- Mas, mas eu sou um estranho...

--- Não acho não. Vamos, ajude-me com a bengala.

O jantar foi servido às oito, à luz de uma vela imensa, verde e hexaedra. Tom, o mordomo, ficava perfeito quando ao servir erguia as sobrancelhas.

--- Tom, não sirva isso ao moço.

--- Não, pode servir tudo. Quero esse patê sim. É de quê?

--- É de fígado de ganso. Foie Gras. Mas hoje em dia poucos comem isso, pois maltratam muito os bichinhos -(Muxoxos)- Meu falecido marido odiava comer coisas mortas.

Findou o jantar e Sofia se retirou misteriosamente. Tom sorria um sorriso enigmático para Mauro Barney, um sorriso de dar inveja à Mona Lisa.

--- Aceita o porto?

--- Com o cais e os navios? Não, obrigado.

--- Bebo esse porto no gargalo.

Sofia voltou vestida de rainha.

--- Tom, coloque Strauss. Venha, meu bem, meu Barney. Este será o nosso sonho de valsa.

--- Oh. Espere. Vou tomar um gole do porto na garrafa mesmo.

--- Não faça isso!

--- Mas Tom faz!

--- Madame, eu jamais faria uma coisa dessas, disse irritado o mordomo.

--- Esqueçamos o que ocorreu. Venha, Maurinho. Vamos dançar?

O casal dançou até meia-noite, quando a compainha tilintou. Tom já estava dormindo eu seu aposento. Barney foi atender e se deparou com um ser pequenino, branco, com olhos imensos. Quando Sofia foi atrás ver quem era, soltou um grito logo que chegou à porta. E depois desmaiou. Era um alienígena.

--- Quer dançar um sonho de valsa?, perguntou-lhe Barney.

 

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