O QUE ESTOU OLHANDO?
Luciana Pareja Norbiato
 
 

No escuro, no quarto escuro... Lancinando, o ar falta-lhe, ela não enxerga nada além do que sua mente projeta, um horror infindável, o ar denso

grito

Para onde ir? Sozinha! Sozinha! Como uma mão a estrangular a garganta, a puxar suas tripas pela boca, alguém vai chegar e dar fim à sua vida de forma violenta e cruel _mas e se isso já aconteceu?_ ela não pode ficar sozinha e no entanto está sozinha sozinha consigo sozinha e a cabeça já foi e voltou uma tonelada de vezes horas de pesos sobre as costas

Ela já não raciocina

tem medo

não se explica isso tudo

que é isso, Deus?

Até que a sensação da maldade do mundo que a estripa e explode seu estômago, sua barriga, suas vísceras (mas tudo continua normal, não percebe? não percebe) paroxismo então ela mesma se machuca

"se eu me machucar, saberão que eu não sofro, ou que sei sofrer, ou que gosto de sofrer"

"não terá a mesma graça para alguém me fatiar com lâminas afiadas, afinal, eu posso sentir dor, eu posso suportar a dor, eu posso suportar morrer de forma hedionda"

Crava os dentes o mais profundo que pode em seu braço direito e não sente absolutamente nada pelo menos no primeiro instante [no dia seguinte, uma mancha roxa evoca torturas sexuais, antes fosse]

Ela terá de trabalhar amanhã, o dia vai se arrastar morosamente enquanto ela tenta manter o muro de sua personalidade erigido para proteger uma dor que nunca foi assim antes

"não quero enlouquecer, não quero acreditar nesse horror dessa forma"

No terceiro dia, ela terá superado a crise psicótica e sua estrutura estará mais firme. Sobreviver à dor é ter acesso a uma forma de poder inenarrável.

 
 

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