MANIA DE BOLINHAS
Leila de Barros
 
 

Quando recém conheci a Isabelle achei-a meio esquisita, possuidora de uma esquisitice que me atraía, devo confessar.

As outras mulheres do escritório possuíam aquele tipo padrão mesmo, com seus conjuntos de saia e blaser e outros trajes mais comuns.

Mas, a Isabelle não. Ela usava muita seda, algodão cru, tons quase sempre claros, que ela fazia questão de combinar com colarzinhos delicados e perolados. O que mais me chamava a atenção era o seu acentuado gosto pelas bolinhas em quase todos os tecidos, ou melhor dizendo petit pois.

Isabelle sempre mantinha sua mesa de trabalho em perfeita ordem e harmonia, era impecável com organização. E quase todos os seus apetrechos eram forrados por tecidos ou papel de bolinhas; a frasqueira, o porta-trecos, a capa de seu caderno de anotações, etc.

Fomos ficando mais amigos à medida que o tempo passava. Ela me contava sobre seus planos de mudar de profissão e fazer algo mais interessante, que lhe permitisse ter mais contato com pessoas. Comentou até que estava fazendo um curso de massagem, uma tal de "ayurvédica". Eu fiz uma cara de aprovação e lancei um olhar de entendido, quase me entregando, pois não consegui pronunciar o nome da massagem novamente. Fiquei pensando que raio de massagem seria essa. A Isabelle não tinha jeito de quem fizesse sacanagem.

Eu, por minha vez, comentei que pretendia fazer meu MBA em Economia, que era divorciado, que morava sozinho e quase que inconscientemente, lancei um olhar de cão sem dono ao mencionar esse fato.

Foi quando ela correspondeu com um olhar mais aguçado e brilhante, eu diria que quase de excitação. Desde então eu não pude deixar de notar seus incríveis e amendoados olhos verdes, que pareciam duas esmeraldas vivas a me penetrar como um laser.

Ao contato mais próximo, percebi que sua saia mostrava levemente um belo par de pernas e sua blusa de seda também insinuava um lindo colo, delicadamente expondo um colar de pérolas. E a essência perfumada que ela exalava, lembrava bergamota. Fiquei perturbado, mas procurei disfarçar.

Um dia, enquanto almoçávamos, ela me perguntou se eu poderia ajudá-la em uma espécie de estágio para um curso que ela estava fazendo e precisava praticar. Meu sexto sentido me deixou em estado de alerta e logo pensei:

"Ela quer me usar como cobaia para o seu curso daquela tal massagem, que não consigo pronunciar direito. O destino está a meu favor!".

Ela me disse que para realizar o tal estágio precisaria passar um dia em meu apartamento preparando o ambiente, para que quando eu chegasse pudesse fazer a avaliação do trabalho dela. Fiquei estarrecido, mas mantive aquela expressão que só nós homens conseguimos manter e que se pode traduzir assim:

"Não estou muito interessado nisso, mas concordo só para ajudar".

Isso causa um ótimo efeito sobre as mulheres!

Marcamos então o dia para ela ir em meu apartamento. Durante o tal o dia, eu praticamente não conseguia pensar em nada, somente na Isabelle fazendo sabe-se lá o quê em meu apartamento e me esperando.

Cheguei finalmente em casa e pude sentir o perfume dela exalando por toda a parte. Notei que ela deixara sua echarpe de seda, com petit pois, sobre o encosto da poltrona. Notei que a sala estava mais organizada que nunca, com suaves toques de mudança de decoração, a mesa estava arrumada, havia um jantar servido sobre ela e um incenso queimando na estante. Eu ficava cada vez mais intrigado e notei que ela também havia deixado uma bolsa de plástico transparente sobre o sofá, com toalha de bolinhas, lingerie de seda com bolinhas e óleos de massagem.

Quase caí sentado no sofá, mas resolvi procurar por Isabelle, já com meus sentidos totalmente alterados.

Eis que surge a Isabelle toda radiante, perfumada com os cabelos ainda úmidos e com uma roupa leve em estilo indiano. Quase pulei sobre ela. Ela me sorriu delicadamente, me deu um beijo no rosto e agradeceu pela imensa ajuda que eu estava prestando. Me apresentou um documento de avaliação de estágio, dizendo que era para eu preencher e entregar para ela no escritório no dia seguinte. Explicou-me que era um estágio para o curso de Governança de Apartamentos de Executivos Divorciados. Então, demonstrando uma certa impaciência, ela pegou suas coisas que estavam sobre o sofá e foi se despedindo enquanto explicava que estava indo para o outro estágio, o de prática de massagem, que ele iria treinar com a secretária do nosso escritório!

Foi então que vi Isabelle sair pela porta, como se fosse um filme noir, levando apressada sua echarpe de bolinhas com o charme de Audrey Repburn em bonequinha de luxo e permaneci em pé durante algumas horas olhando para a mesa posta e o apartamento impecável sem conseguir reagir.

 
 

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