BIG BANG
Lady Lazarus
 
 

Parecia impossível pra ela livrar-se daquele amargo gosto provocado por vãs insistências. O pobre telefone não tocava, calava. Não respondia aos seus irrefletidos apelos. Só uma frase já lhe bastava...

Mas nada. Nenhum movimento ou qualquer gesto denunciador. Entre eles as coisas permaneceram intocadas, nenhuma palavra foi dita ou escrita desde o último dia em que se viram. Dava-se, assim, o previsível hiato.

Ela já era consciente que isso um dia lhe chegaria. Não sabia quando ou como seria. Só sabia que em algum momento o cisma se realizaria, como numa profecia.

O fatídico dia chegou. Tornou a vê-lo. E não foi difícil pra ela notar que estava diferente daquele que conheceu. Um não-sei-quê denunciava que sua presença incomodava, embaraçava. Não mais animava ou reencontrava.

Como não podia ser diferente, todas aquelas sensações, tão íntimas suas, recaíram sobre ela. Seu caminhar não era sem dificuldade. Enxergar, escutar... já não lhe era mais possível, apenas um ruído mudo de relativa multidão preenchia-lhe os ouvidos. Vultos era somente o que seus olhos viam. A angústia lhe implodia... Buscava um recôndito. E nalgum canto ficou. Sentia que sua velha ostra a guarnecia. E foi passando... Os ares lhe foram retornando e os contornos, na distância, foi ganhando.

Lembranças, tão danosas nesses momentos, lhe chegavam à mente. O que poderia ser mais triste do que um desencanto? Era a morte, a musa das desilusões, que lhe dizia isso.

As imagens que habitavam o alto de suas abstrações começaram a fazer seu caminho de volta. Ascensões, ideações, metáforas, caíram por terra. Descerem ao grosseiro nível das relações chinfrins, tão iguais... O extra-ordinário torna-se ordinário. A estrela sai da órbita. Entidades celestes tornam-se meros joguetes. Deuses, totens, musas, personagens de uma história comum, perderam suas máscaras, entraram em descompasso, esqueceram suas deixas.

Tudo isso era o que relampejava em sua mente débil. Enfraquecida por torpes visões, via desmanchar-se, instantaneamente, o castelo de sonhos que para si construiu. Voltava à sua morada solitária, ao B-612, donde nunca deveria ter saído.

Ao mesmo tempo, tentava explicar o caso por si mesma. Arranjava situações, possíveis imprevistos causados por acontecimentos involuntários. Talvez...

Ficava nesse jogo de idas e vindas, imaginando-se vítima de uma refinada alma profana e esperando o novo big bang que os fariam unir-se novamente.

 
 

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