ÚLTIMA VEZ
Victor Loureiro
 

Ele se levantou em silêncio, para não acordá-la. Buscou as calças cuidadosamente colocadas sobre a mesinha que ela usava para trabalho e a camisa posta sobre o assento da cadeira. A caminho do banheiro, quase tropeçou tentando calçar as meias e preparar a gravata para o nó. Olhou-se no espelho, borrifou o desodorante e penteou os cabelos com ajuda de uma mão cheia de gel. Ainda checou se a barba estava bem aparada e, constatando que sim, sentiu-se mais aliviado. Acertou, afinal, o malabarismo da seda prateada ao redor do pescoço e, olhando-se ali, pronto, com o indicador afastou discretamente o colarinho de sua laringe e engoliu seco.

De volta ao quarto, vestiu o paletó do terno. Cobriu a mulher que encontrara no bar, na última noite, com o fino lençol que acompanhara a dança dos dois nas últimas e muitas horas, e a viu gemer no conforto do sono. Suspirou e se abaixou para pegar os sapatos, que só calçaria ao chegar à porta. Apalpou os bolsos à altura das costelas para se certificar de que não esquecia nada e saiu em direção às escadas da casa.

O relógio marcava sete da noite, o que lhe daria menos de trinta minutos para percorrer os mais de vinte quilômetros que o levariam à igreja, aos familiares emocionados, aos parabéns dos amigos e ao sim apaixonado de sua futura esposa. Abriu a porta jurando a si mesmo que aquela havia sido a última vez.

 
 

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