FAZENDO HISTÓRIA
Hugo Carvalho
 
 

Na Grécia nasceu o sistema político que, se não for o ideal, tem se mostrado o menos ruim. A democracia. E foi perto dali, onde se fez Roma que, segundo a lenda, os gêmeos Rômulo e Remo, pendurados nas tetas da loba, nos ensinaram o método.

Pater e mater, vocábulos latinos dos romanos, nos deixaram descendências. Do primeiro são oriundos pai, padre, pátria. O segundo nos deu mãe, madre, mas não nos deu mátria. Deveria ter dado posto que, mamar nas tetas da mãe é coisa antiga e, nas da pátria, - que por tal deveria ser mátria - também.

Tudo isso a propósito de, em Terra Brasilis, havermos aperfeiçoado o helênico sistema. Acrescentamos ao mesmo, pitadas de servilismo feudal com toques pseudo-aristocráticos; juntamos colheradas de alegóricos casuísmos, nada éticos, com fortes fragrâncias anárquico-socialistas; temperamos com coronelismo clerical e discretíssimas notas de lírica cidadania igualitária. Não satisfeitos, e sem esquecer dos parentes e apaniguados, mesclamos alentadas doses de burocracia e mandamos agitar a massa pelos passistas de uma escola carnavalesca executando o samba-enredo "Pizza Nostra". Nosso sistema ficou uma beleza!

Quanto ao latino hábito mamífero, fomos adeptos do mesmo, até pouco tempo atrás. Agora resolvemos abandona-lo. Não mais nos contentamos com o leite da loba. Afinal, leite é para as criancinhas. Enjoamos do leite e, por conseguinte, das tetas.

Viramos hematófagos. Queremos pescoços. E nisto, fomos mais longe. Aperfeiçoamos outro processo. O do conde da Transilvânia. Nada de se cravarem dentes nas jugulares fraternas. Temos os hemodutos, alegria dos angiologistas afeitos que estavam, até então, a singelas carótidas, femorais e artérias tais. Hemodutos de generosos calibres. Causam inveja ao boliviano gasoduto.

Estamos envergonhados em Terra Brasilis.

Antigamente dávamos o sangue pela pátria. Recordemos os voluntários da Guerra do Paraguai. Fizeram história. Receberam, por conseqüência, justas homenagens. Mereceram o nome em ruas. Voluntários da Pátria.

Agora, muitos de nós, integrantes não íntegros do adaptado sistema grego, sugamos o sangue de nossos irmãos. Também estamos fazendo história. Merecemos estátua. O nome? Vampiros da Pátria.

 
 
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