PUDINZINHO
Doca Ramos Mello

Eu sei que você não reparou direito naquela lambisgóia assanhada, eu sei. Você nem viu o traseiro que ela empinava enquanto os fotógrafos faziam fotos, você não ficou saracoteando como quem dançasse de nervoso só com a aparição da loira, ô palhaço... Sim, 'tô sabendo que p'ra você o que importa na mulher é o interior, acha que não reparei em você despejando esses seus dois olhos que a terra há de comer em breve, se Deus for justo, até porque se Ele não fizer justiça, faço eu, pois eu bem vi os dois olhos seus dependurados no interior do decote da garça, para depois deslizarem bem no meio das costas da cretina, quando ela fez aquela voltinha asquerosa, você é um ordinário de primeira, não vale um ovo...

É, você me ama... Eu sou...como é mesmo que você diz...o seu 'pudinzinho'... Tem coisa mais brega que pudinzinho? Pudinzinho é o raio que o parta, eu lhe mostro o pudinzinho bem no meio do nariz, vai ver só... Insegura, eu?! Se sou insegura, morde aqui, eu só 'tô falando porque você me fez passar aquele ridículo bem na frente do Edu com a Catarina, você sabe que eles devem estar rindo até agora, rolando de rir de mim...

Ciúmes, eu? Daquela lá? Ah, me economize cristão, aquele joelho seco, o andar de esmaga-goiaba, 'cê' acha? Produção, meu caro, aquilo é produção pura! Até eu, ajeitadinha, cabeleireiro bom, maquiagem, roupa cara, fico linda. Bote milhões em cima de mim e você vai ver se não pareço um espetáculo, aliás, eu já fui um espetáculo, lembra? Vou lhe dizer o que, ou melhor, quem me acabou com a beleza...

...Mas eu tô falando mesmo é da sua indelicadeza, que sujeito mais sem classe, eu mereço? Você babando feito bezerro desmamado, não podia se controlar, não podia? Ah, era só na tv, só na tv, e daí? Eu ouvi quando você suspirou, fez até ufff-bufff, se remexeu todo no sofá, insuflou as bochechas, diga se não suspirou, seja homem! Aliás, até o Edu também suspirou quando ela apareceu com aquele pedacinho de pano cobrindo o biquíni e a coluna empinadíssima, vocês dois suspiraram sim, a Catarina não ouviu porque é lerda, parva, eu, meu bem, durmo com um olho só, eu sei da minha vida, a Catarina não presta atenção porque tem uma miopia conveniente, coitada, eu conheço o Edu de outros carnavais, nem me fale... Por falar em carnavais, tenho ódio só em lembrar de vocês dois naquela escola de samba, fantasiados de diabo, rebolando no carro alegórico com a Rosinete, a Rosinete representando as chamas do inferno, ô coisa mais brega! Ah, agora vai me dizer que não se recorda da Rosinete, quer que lhe refresque a memória, que relembre a história do perfume? Palhaço, canalha!
Não tem fashion e não tem week, meu caro, aqui ninguém mais assiste a desfile nenhum, que eu não estou aqui de boca aberta p'ra marido meu ficar suspirando na minha cara, se assunte sujeito, o bicho vai pegar p'ro seu lado. E desde quando você gosta de moda, heim? Virou estilista, por acaso? Que meu benzinho, mané benzinho, era pudindizinho que você dizia, Deus me perdoe, ninguém merece...

Rá, rá, rá, e se você chamasse a bonitona lá de pudinzinho, heim? Ah, tenho certeza que a Gisele Büdchen ia se afogar de rir na passarela! Pudinzinho, pudinzinho, fique sabendo que ela foi noiva de Lonardo di Caprio, nada mais, nada menos, aquele que morreu no Titanic, tá sabendo? Aquele pedaço de loirinho de Hollywood, o cabelo todo no lugar, a boca carnuda, a pele de bebê, meu caro, um astro americano! E pode ter certeza de que ele nunca chamou a moça de pudinzinho, não é louco nem nada, é ator de cinema, meu bem, sabe onde fica Hollywood? Ora, se exergue, meu camarada, e pode tirar a mão daí que esta noite você dorme é no sofá, ô pudinzinho...
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