DO ALTO DO ARRANHA-CÉU
Patrícia da Fonseca
 
 

Por que somos capazes de proferir palavras que são capazes de destruir tudo? Por que não cerrei meus lábios no momento oportuno? Errei a mão, joguei tudo fora e nunca me senti tão desprotegida em minha vida. Claro, não devo mais mostrar minha insegurança para ninguém. Não é interessante para mim que todo mundo saiba o quanto eu tenho medo. Não quero falhar de novo, não quero mais magoar ninguém. Então, aqui na minha janela, onde eu consigo enxergar toda a imensa cidade em que vivo, sinto-me constrangedoramente pequena, minúscula. Queria que alguém me protegesse. Mas este alguém definitivamente se foi.

Vivo tão perto do céu, que sempre costumo dizer que tenho por vizinhos os pássaros, as nuvens e Deus. Evidentemente, quase nunca lembro deles. Não tenho tempo. Vez por outra, enxergo estrelas no céu, quando me recordo de olhar para cima. Hoje consigo ver tudo aquilo para o que sempre fui cega. Aos meus pés, vejo as pessoas caminhando, juntas ou sozinhas. Porém nenhuma tão solitária quanto eu. Fico pensando nas coisas que fiz e naquelas que jamais deveria ter feito. Quantos conhecem meus erros? Quantos sabem que eu não sou a criatura segura e firme que sempre tentei mostrar que era? Agora, aqui na minha janela, tão perto de Deus, a insegurança de minha própria vida toma conta de mim. Gostaria de sair do meu apartamento, dar uma volta lá embaixo, aliviar minha angústia. Quem sabe o ar da noite não aliviasse meu coração?

Mas conhecendo-me do jeito que me conheço, sei que não teria condições de sequer saltar do elevador. A minha própria culpa me aniquila, joga-me ao nível do chão e não há solução para mim. Não nesta noite. Quem sabe na manhã seguinte.

Quem sabe na manhã seguinte, quando eu me acordar, a culpa já tenha me deixado, depois das tantas preces que elevo ao céu, esta noite. Ou as lembranças de palavras mal ditas e malditas tenha se apagado da minha mente para que eu pudesse sentir-me só um pouco mais forte. Um pouco só. Apenas para que eu consiga respirar melhor, mais fundo, sem tremer tanto.

Não, por favor, Deus, não deixe que todos saibam o quanto eu me sinto fraca, insegura e doente. Somente deixe que o ar entre todo nos meus pulmões e que meus olhos parem de chorar. Deixe-me dormir, dormir, nem sonhar eu quero mais.

E quando meu sono chegar de mansinho - caso ele também não me abandone - vou fechar os olhos e imaginar que nada aconteceu. Quero ser enredada pelo véu da escuridão, pela segurança do esquecimento e voltar a ser o que eu era, tudo de novo outra vez.