DOIS MUNDOS
William Stutz
 
 

Caminhos os há, difícil é saber qual seguir. Terra batida, atoleiros ou asfalto.

Caminho cósmico - estrelas. Via Láctea sinalizada - estrada de sonhos. Misteriosa magia. Aquecia por dentro de prazer só de pensar.

Deitada no telhado frio do curral vigiava o mover dos astros. Encantada com a viagem anunciada.

Trecho infinito a percorrer. Belo luminoso. Volta e meia uma luz mais agitada cortava seu campo de visão, de vigília a devaneio. Visitantes estelares ou um simples balão meteorológico a espiar nuvens, mares e ventos? Um paranóico avião espião em busca de novas ameaças imaginárias? Balança a cabeça como a espantar a idéia. Quanta falta de poesia. Eram com certeza alienígenas vestindo impecáveis uniformes prateados. Raça evoluída com ânsia de dividir conhecimento. Gente do bem, vindos de muito longe.

Já os havia visto em ocasiões diversas. Em sonhos, durante enfadonhas preleções matinais na igreja. Durante as aulas de matemática, nos intermináveis almoços e jantares familiares. Principalmente quando tias e primos desconhecidos por lá aportavam - vinham da cidade. Chatos. Principalmente os primos com seus tênis de grife e palavreado entrecortado, meias e preguiçosas palavras sem nexo. Eles cheiravam ar condicionado e sanduíche de shopping. Debochavam em silêncio de suas roupas e de sua botina mateira.

Mas a presença deles era mais comum à noite, logo depois de seu pai desligar o motor da energia. Eles gostavam muito do escuro ou da fraca luz do candeeiro. Visão acostumada à escuridão do cosmo, devia ser isso.

Uma estrela cadente cruzou o céu, passou raspando a copa da mangueira, iluminou o pasto. Mãe do ouro.

Caminhos os há. E em breve teria que escolher o seu. Não queria a cidade - traçou o dos céus, para lá é que ia longe, bem longe.
Breve, muito em breve.