EU E MISTER BB. KING
Bee Scott
 
 

Nossas vidas, nossos sonhos,quais são os sonhos de uma criança?

A correria do dia a dia não nos permite perguntar, mas eles estão lá, sendo construídos, na quietude...

Na pequena Laguna -SC, na cozinha de casa, longa de ladrilhos azuis, mesa grande, casa de Italianos, ouvia meu pai cantando Ópera! Pouco a pouco, meus sonhos foram se criando, se formando e não existia um ídolo maior pra mim, mas os sonhos voam longe.

Precisamente, 1989 em São Paulo, começaram meus desafios de cantora e mulher onde, após a morte de meu pai, ampliei meus horizontes e encontrei um novo rumo, um novo ídolo. Alguém que tornou minha vida uma fonte inesgotável de criação e de inspiração, Mr. B.B.King. Este homem mudou meu comportamento, com sua guitarra sua voz e sua alma explicita, invadiu meu corpo e me deu asas para ser eu mesma, na rota do que realmente queria fazer. Libertei-me.

B.B. king veio ao Brasil, inaugurar a casa de blues Bourbon Street, lembro -me que era caro demais para minhas condições naquela época, mas por ele, valia qualquer sacrifício até mesmo juntar as moedas. E lá fui eu, de vestido de lantejoulas prateadas e um básico casaco preto. Assisti ao show como quem assiste a um culto, calada e ao mesmo tempo em transe, estava perto, tão perto que meus olhos marejavam a cada solo. As notas vinham na minha cabeça, era como se eu já o conhecesse por dentro.

Elegante demais, é Mr. B.B. King, terno preto com flores prateadas com sua Lucille preta, com detalhes em marfim. Suas mãos são grossas de um negro que trabalhou com a colheita de algodão, dedos cheios de anéis que brilhavam tanto, ofuscavam meus olhos, dedos mágicos de um Rei.

O show acabou, houve um vácuo, faltava algo, minha alma estava triste! Então resolvi burlar os sistemas que impediam que qualquer pessoa tivesse contato com o rei do blues.

Nunca me interessei por autógrafos, apesar de admirar grandes nomes da música. Mas B.B. King? Eu não poderia ficar sem ao menos tocá-lo. Neste dia, o Rei estava indisposto, segundo algumas fontes da casa e poucas pessoas poderiam falar com ele. Vi meus desejos esvaindo-se ali, bem ali, num trailer a lado da Bourbon Street. Acabou! Pensei comigo, quando de repente, vejo uma movimentação dos produtores, câmeras e jornalistas, era ele! Mr B.B. King indo embora, já estava de terno cinza e, sobretudo do mesmo tom. Eu devia estar a uns cinqüenta metros dele, estava de costas, dirigindo-se para o longo carro preto que o aguardava na porta.

Foi quando meu peito se encheu de coragem e eu deixei minha timidez e meus saltos de lado: gritei alto. BIBI! Com a maior intimidade, sem pudor, afinal, ele já fazia parte do meu universo sonoro, minha voz já conhecia o caminho de sua alma.

Achei que ia desabar o mundo se ele não me escutasse. Ele não só ouviu, como voltou-se em minha direção, olhando fixamente para a moça de lantejoulas pratas, estava estática ao encarar seu mestre.

Como um bom gentleman que Mr King é, caminhou até mim, abraçou-me forte. Quando vi estavam todos ali, câmeras e produção, nada importava, parecia que nós estávamos sozinhos, era eu e ele, eu cantava suas músicas, estava ali frente a frente com o Rei do Blues. Travei.

Passados oito anos, eu já estive com ele duas vezes, hoje eu posso senti-lo dentro de suas palavras autografadas no livro que conta a verdadeira história deste mestre!