O LIVRO DE VIAGEM
Andrea Natali
 
 

Marina nunca tinha viajado. Nem sabia o que significava arrumar as malas, escolher um lugar bacana para conhecer, fazer amigos, entre outras coisas; mas ela sempre viajava pelos seus sonhos. A pequena menina era filha de Dona Cida, a empregada do casarão de uma pequena cidadezinha do interior de São Paulo. O casarão de Dona Júlia ficava afastado do centro, mas ela fazia questão que Cida levasse a menina à escola. Seus filhos já eram adultos e depois da viuvez seu passatempo predileto era contar histórias para a pequena Marina e cuidar de sua horta.

Um dia, depois de uma visita da família, a filha mais velha de Dona Júlia deixou no casarão um livro de viagem bonito, grosso, sobre os grandes lugares do mundo para conhecer e viajar. Era um livro caro, com certeza, era muito caro, pois nem na escola de Marina havia um livro tão bonito quanto aquele. O grande livro havia ficado sobre a mesa de centro da sala e todo dia Marina aproveitava quando Dona Júlia não estava por perto e ia até lá devorar cada página daquela maravilha.

Dona Cida não gostava da atitude. Achava uma intromissão da filha mexer nas coisas da patroa, pois ela sempre comprava livros para a menina, além do mais ela não queria a filha pedindo nada, afinal a dona da casa sempre ajudava com livros, cadernos, roupas, não era justo ficar pedindo algo mais.

Até que um dia, Júlia entrou na sala e flagrou a pequena Marina com os olhos grudados no livro e com o pensamento longe, mais longe que os locais mostrados no livrão. “Marina, querida, você está viajando!” – surpreendeu-se a senhora.

“Não, Dona Júlia, eu não vou viajar com o seu livro, não vou levá-lo embora” – respondeu a menina assustada.

“Filha, deixa eu lhe ensinar uma coisa: você pode viajar com seus pensamentos! Não precisa sair daqui do casarão e ir para uma outra cidade. Você pode fazer com que os seus pensamentos façam de conta que você está num outro lugar, como este aqui da foto... que está aproveitando, passeando, conhecendo lugares, pessoas. Isso é um bom exercício!”

“Exercício? Mas por que é um bom exercício?” – perguntou a menina.

“Porque faz você sonhar. Viajando através do pensamento, você cria lugares e situações onde gostaria de estar e deve transformar essa viagem em objetivo! É viajando nos nossos sonhos que, quando maiores, traçamos objetivos e buscamos uma vida melhor”.

A menina fascinada com tudo aquilo que acabara de ouvir, deixava o olhar se perder pelas fotos coloridas e atraentes, tentando absorver a lição de Dona Júlia.

“Fique com o livro. É um presente meu. Com certeza, ele lhe será muito mais útil do que a mim. Viaje muito em seus sonhos com este livro, Marina, pois assim irá estudar, trabalhar e batalhar muito na vida para estar em cada um destes lugares”.

Cida olhava tudo emocionada. Ela era de origem humilde e seu sonho era ver a filha com uma vida confortável, sem precisar cozinhar e lavar roupas para outras pessoas. Naquele momento, agradeceu a Deus por estar ao lado de uma pessoa tão boa. Até nos sonhos de Marina, Dona Júlia ajudava. Que mulher maravilhosa!

O livro virou a viagem constante de Marina. Todos os dias, ao menos durante uma hora, ela fechava a porta do quarto, ‘arrumava’ a mala dos sonhos e viajava pelo infinito do pensamento.