UM OLHAR SOBRE O FUTURO
Mairy Sarmanho
 
 

Desde pequena, acostumei-me a pensar no futuro. No início, o futuro era entrar para o colégio, aprender a ler... Como demorou para chegar esse momento! E quanta indignação quando descobri que não era divertido da forma que imaginei! Foram longos anos sentadas em cadeiras duras aturando discursos de professores que me forçavam a repetir, até cansar! E eu cansava tão logo...

Depois futuro era trabalhar. Ter meu próprio dinheiro, ser dona do meu destino! E como foi delicioso esse momento, o primeiro salário, minha independência, juntar para comprar meu apartamento, lutar para conseguir minha tão sonhada liberdade! Aconteceu nesse futuro de encontrar um homem maravilhoso que, mesmo sem planejar, tornou-se meu companheiro para o dia seguinte. E o sonho posterior.

Agora sonhava com o dia em que me aposentaria, poderia viajar, curtir a vida, aproveitar tudo o que não pudemos antes... Porém, percebi que o futuro é algo certo mas um pouco diferente do que imaginava. Minha mãe foi operada e necessitou ficar numa geriatria para ser cuidada durante esse período de convalescença. Eu, que nunca tinha entrado num lugar desses, admirei-me com o que descobri.

No início, o choque. Todos velhos, alguns muito velhos... Mas, no momento seguinte, percebi que eram meu provável futuro, o futuro de todos exceto os que morressem antes. Descobri uma senhora linda, maravilhosa, cujo nome era igual ao da Monalisa, cujos olhos diziam tanto e transmitiam tanto amor! Ela me guiou para o futuro, de uma forma que nunca pensei acontecer. Gioconda me falou do passado, da infância, da juventude, da maturidade e, entre alguns poucos devaneios, percebi-me ali, infiltrada naquela alma, como se tivessemos sido amigas há muito tempo atrás... Aquela senhora de cabelos de neve atravessou comigo uma fronteira e abriu meus olhos para o que nunca imaginei existir.

Descobri que poderia fazer algo por eles. Contar histórias, ensinar informática, ensinar a pintar, ler poesias, fazer um carinho ou, simplesmente, ajudar aqueles que não mais são capazes, a comer. Um gesto simples é retribuido com um sorriso encantador, gentil, amigo. Quem nunca entrou num desses lugares, deveria faze-lo. Não é um local de abandono ou de repulsa, como prega nossa sociedade competitiva e fútil. É um templo de amor e sabedoria, onde temos tanto a receber com um pouquinho de tempo que lhes dedicarmos. Existem histórias fascinantes, material para meus próximos livros, para meus próximos sonhos, para os próximos encantos.

Não tenho medo do futuro. Nunca tive. Ainda mais agora que o sei bem, apesar de uma grande diferença temporal me separar dos moradores da casa geriátrica. Quero lhes devolver o sonho, ensinando alguma coisa que sei, enquanto eles me entregam, de boa vontade, seus ensinamentos sobre a vida!

O amanhã há de vir. Não importa que ninguém saiba. Eu sei.