DIVAGAÇÕES DO EXÍLIO
Tatiana Alves
 
 

Meia hora na varanda fora suficiente para ele perceber que odiaria aquele lugar. Ao ruído insistente de buzinas que pareciam acreditar que havia trânsito ali que justificasse o seu uso, acrescentavam-se carros com o som alto de funk, mostrando mais a potência do aparelho do que o bom gosto do dono.

Do outro lado da rua, alguém podava - não, mutilava - uma árvore, talvez a única forma de vida igual à da civilização, sem mutações ou simulacros. Um fusquinha desbotado e seu motorista, com ar imponente, passavam agora pela rua ainda sem asfalto, e que nunca o teria, já que, perante a prefeitura, não constava como tal.

As moças do local, com suas batinhas da moda e enfeitadas com bijuterias de qualidade discutível, compunham um cardume de árvores-de-Natal que passava, de olhar altivo, desafiando o estranho que as observava, com cochichos, especulando-lhe a origem. Ou seria estrangeiro? Sentia-se tão alheio a tudo isso, que talvez fosse uma espécie de estrangeiro. Talvez vivesse em algum universo paralelo, e aquilo que pensasse ser a realidade não passasse de mero devaneio e isto, sim, fosse a realidade. Mas, se era este o caso, queria desesperadamente o Prozac/Lexotan/Ópio/sonho que o restituísse àquele outro lugar, onde as colunas de mármore pareciam portais que, adentrados, conduziriam finalmente ao seu mundo.