CAMPANHA PARA AMPUTAÇÃO
Beto Muniz
 
 

Dizem por aí que vão diminuir a maioridade criminal/penal para 16 anos e que isso resolveria a questão da violência no país. Vira e mexe nossos legisladores inventam leis ou campanhas como aquela do desarmamento. Estes eventos são excelentes momentos para que eu ressuscite o anarquista em mim. Este adormecido, quase covarde, vencido pela rotina dos dias... Estou sem vontade alguma de desenvolver esse assunto, mas preciso me expressar diante de tanta burrice. Acredito de verdade que são os pais os grandes responsáveis pelos filhos que colocam no mundo e pelo que se tornam... Mas eu dizia que gosto destas campanhas onde as imbecilidades dos governantes são escancaradas ao povo. Sim! É preciso desarmar o cidadão porque não existe competência nos governantes para dar segurança. Adolescentes estão cometendo crimes? Somos incompetentes também para resolver a questão da integração social. Mas é preciso mascarar essas incompetências, é preciso colocar a culpa em alguém, em quem? No caso da proliferação de armas imputemos culpa no cidadão, aquele pequeno percentual de homens honestos que têm uma arma legalmente guardada em casa, quietinha, sem fazer maldade alguma neste mundo. No caso do adolescente convocado pela violência, vamos diminuir a maioridade criminal que resolve. Não passa pela cabeça dos homens do poder que o correto seria desarmar o bandido, oferecer perspectivas ao adolescente. As boas idéias não passam, e se passam não vingam, logo são descartadas porque é muito difícil, muito complicado convencer o bandido a entregar suas armas no posto policial mais próximo. Complicado também lidar com adolescente pobre, de periferia, filhos de pais desempregados. Porque se preocupar com esses jovens sem possibilidades de cursar ensino superior? Simbora desviar o foco e colocar a culpa no cidadão honesto, pagador de impostos. Que este pacato não oferece nem perigo nem resistência.

Desde criança que aprendi a manusear armas. Meu pai e meu avô eram exímios atiradores, e diziam que meu bisavô foi matador de onça, depois delegado. Famoso! Não sei, nunca li histórias sobre os feitos dele, nem registros de sua atuação como homem da lei, mas deixei que as glórias a mim narradas continuassem fazendo parte das lendas familiar. Criado em vila do interior mineiro, área ruralíssima, caça em abundância e, lógico, armas em casa, nunca atirei em algo que eu não queria acertar. Também não preciso dizer que acidentes nunca aconteceram. Por que não? Porque fui informado desde pequenino dos perigos que uma arma representa se não for respeitada. Tinha onze anos e uma espingarda à minha disposição sim, mas também tinha obrigações impostas. Levantava ainda madrugada para cuidar da horta, molhar todos os canteiros antes do sol nascer para a geada não queimar a plantação, depois tomar café com leite tirado na hora, comer bolo de milho, montar a égua e ir para a escola. Na volta para casa comida feita em banha de porco criado no terreiro, bora trocar a água dos porcos; fritar um ovo dos ninhos no mandiocal, toca debulhar milho para as galinhas; morder um pedaço generoso de queijo, apartar as vacas dos bezerros. Merenda acompanhada de doce de leite ou mamão verde ralado e só então, sol à pino, caçar inhambu, codorna, perdiz. Todas as horas dos meus dias eram cheias de afazeres impostos e cobrados por meus pais. Mamãe conferia meus cadernos todos os dias, papai nem precisava conferir a lida diária, se eu não cumprisse com cada uma delas a subsistência da família estava comprometida. Desde pequeno fui ensinado a ser responsável e arcar com as conseqüências dos meus atos, coisa que, atualmente, nem família nem governantes se preocupam em ensinar. Menor de 14 anos trabalhando? Nem pensar? Quatro horas de aulas diariamente e depois rua, a entrega de nossas crianças nas mãos de vagabundos e bandidos foi oficializada. Dá nisso que estamos recebendo na carne e nos noticiários, violência! E para combater só mudando a lei diminuindo a maioridade penal ou chamar a igreja e um bando de desavisados para juntos convencerem o país que armas são perigosas... Ora! Qualquer imbecil sabe que a maldade e o perigo moram no coração do homem, não nos objetos que ele inventa. Não fosse a criação recebida de meus pais eu poderia facilmente ferir qualquer pessoa com uma pedra, um pau, com as mãos... mas é arriscado eu dizer isso, podem articular uma campanha para me amputar as mãos. Né?