CAIU
NA REDE
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José
Luís Nóbrega
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Sábado
à noite e eu aqui toda produzida pra jantar numa peixaria. Peixaria
é só onde se vende peixe cru, ou serve também para
dar nome a um restaurante que só serve peixe, ah, sei lá,
isso agora não importa. Estão dizendo que esse é
o melhor lugar da cidade pra se azarar no sábado à noite.
Pô, mas azarar num restaurante que só serve peixe, deixa
pra lá, já tou aqui mesmo. Isso, relaxa, pára de
ficar batendo as unhas no porta-guardanapos. Ih, droga, lasquei o esmalte.
Isso, fica quietinha, chama o garçom, pede o cardápio.
Pra disfarçar dá uma olhadinha por cima do menu, perfeito,
com calma. Aquele de bigode não. Odeio bigode, aquela coisa espetando,
parece que tá sempre com resto de comida, écu, que sujeira.
Aquele tá acompanhado. Por que sempre achar os homens acompanhados
mais interessantes. Se bem que ela também é muito bonitinha.
Pára, pára, não pensa nisso, tira o olho da garota.
Volta o olhar para o cardápio, disfarça, meu Deus, nunca
imaginei que um prato de peixe custasse tão caro. Não
vou ter dinheiro pra bancar isso. Não é possível
que nenhum pretendente vai cair na minha rede hoje, aquele ali, bom,
aquele tá sozinho, meia idade, simpático, bem vestido,
que partidão. Não fica olhando assim, direto, chama o
garçom, pede um guaraná com gelo, ah, não posso
esquecer de pedir uma rodelinha de laranja, fica mais chique. É
laranja ou limão, sei lá, não pensa nisso agora,
pensa na pescaria, eu preciso ficar com alguém hoje. Isso, joga
a isca, olha pra ele agora, sem disfarçar, passa a mão
pelo cabelo. Todo homem sabe que quando a mulher passa a mão
pelo cabelo é porque tá dando mole. Não é
que ele olhou. Pára de bater essas unhas vermelhas na mesa, tô
parecendo uma adolescente. Olha pra ele de novo. Mas que saco, o cara
só come. Tá olhando pra cá mas parece que não
tá vendo nada. Uma passadinha de dedo no gelo. Não, não
vai me levar esse dedo molhado na boca, o cara vai achar que eu sou
uma qualquer. Disfarça, olha pra ele. Pronto, caiu, mordeu a
isca, ele tá olhando, belo trabalho, garota. Parou de comer,
tá até se inclinando nessa direção. Não
precisa recolher a linha agora, deixa ele se entregar mais. Olha pra
ele, dá uma piscadinha. Meu Deus, não acredito, parece
que ele já tá dando um sinal. É, ele tá
tentando me dizer algo. Deixou até o garfo e a faca no prato.
Tomou mais um gole de vinho. Deve tá tomando coragem. Outro gole.
Que goladona, assim é que se faz garoto. Não tô
entendendo esse sinal. Ele tá tentando me dizer algo. Isso é
pra eu ir até lá. Pô, o cara podia gesticular mais
devagar. Ah, minha santa, agora vai, ele já soltou até
a gravata, certeza, tomou coragem. Ele tá tentando se levantar.
Será que tá bêbado, não consegue levantar
o corpo com os braços apoiados na mesa. Caramba, deve ter ficado
nervoso com essa situação, não pára de passar
a mão pela garganta. Isso, agora pode recolher a linha que ele
vai vir até aqui. Pára de me gesticular e vem até
aqui, isso, levanta, isso, levanta. Xi, o cara desabou, será
que desmaiou de vergonha, de medo de vir até aqui, ah, não,
o garçom tá enfiando o dedo na garganta do cara. Tá
pedindo ajuda pra mim. Ai, minha nossa, o sujeito não tava me
dando mole nada, o desgraçado engasgou com uma espinha de peixe.
Levanta devagar, disfarça, deixa uns cinco reais na mesa pra
pagar o guaraná. Minha nossa, esse cara vai morrer, e eu achando
que ele tinha caído na rede. Que morra...
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