DESCOBRINDO AGORA
Alice de Sousa Silva
 
 

Tiveram uma briga feia. Não, foi uma discussão de casal em fim de casamento, quando o ódio entre ambos é palpavel. Ela estava pondo roupa no varal, fazendo seu serviço domestico, depois de ter estudado exaustivamente para fazer umas provas. O fato é que ele sem mais nem menos perguntou se ela sabia quem ela era. Ele mesmo respondeu: NADA, voce não é nada, voce não tem nada, nunca teve e nem nunca vai ter, porque voce é egoista e orgulhosa. (Ela não era)Porque voce não faz o que eu mando, não me obedece, se fizesse tudo que eu mando...(ele queria que ela vivesse a vida dele, não a dela)diante do silêncio estarrecido continuou:Voce não serve nem como empregada doméstica, voce não sabe cuidar da casa, voce não sabe arrumar a casa de acordo, voce faz tudo errado. (Ela achava que sempre fizera tudo direitinho) Voce não merece essa casa, essa vida que voce leva...*(aqui uma pausa para um comentário , ele falava como se proporcionasse a ela uma vida de dondoca, a vida deles sempre foi apertada, nada de passeios,viagens, nada de restaurante, tudo ali na cozinha de casa com ela pilotando o fogão, nada de empregada...teve 3 filhos praticamente sozinha, chegava da maternidade, adeus dieta, cuidava dos bebes, dela, da casa, dele, dava conta de tudo e nada faltava, pelo menos era o que ela pensara ate ali. Comida feita, casa limpa, crianças limpinhas, banhadas, nunca nem trocou uma fralda cagada...)A verdade é que sempre foi uma Amélia. Quem dá valor pra Amélia? Mulher boba, caseira, sem pretensões, vida familiar em primeiro lugar? Marido nenhum. Mulher boa é aquela que dá pra fora, que fuma, que gosta de gastar, de passear, viajar, que agita a vida dele e não dá sossego.Pensou furiosa mas se calou. Continuando... disse que ficou doente de tanto comer a comida horrivel dela,(Detalhe ela cozinha bem) comida ruim, que ia matar os filhos com aquele tipo de comida.(Aqui ela pensou que talvez fosse as comidas nordestinas que ela fazia vez ou outra, cuscuz com leite, tapioca com coco,pirão de carne de porco ou de peixe)Ela reagiu e falou que se era tão ruim assim viver com ela, se ele estava morrendo por causa dela que fosse embora, ele simplesmente disse que quem ia embora era ela,( ele esta me expulsando? pensou magoada ja com lagrimas incontroláveis) porque ela estava estragando a casa que ela detestava. O estrago a que ele se referia foi a reforma que ela tinha feito no ármario, pra melhor claro. sobre detestar é que ela reclamava por não ter espaço suficiente nos armarios pra guardar as coisas dos 5 menbros da familia. Emfim muita barbaridade que a fizeram ver na realidade quem ela era para ele. Veio-lhe um pensamento urgente: quero descobrir a verdade, descobrir realmente quem eu sou, a esposa má, a mãe negligente,ou uma mulher troxa mesmo! Sempre preocupada em não gastar, sempre contando pra não faltar pra pagar as contas. Descobriu que os elogios foram falsos, todos os sacrificios foram em vão, nenhum reconhecimento por nada. Viu que aquela promessa de altar, na doença e na saúde nunca foi posta em prática já que tudo sempre foi ela, as doenças das crianças, as internações, noites e noites em claro em hospital, em casa, as febres, os vomitos, as diarréias, os horários dos remédios. Sempre o poupara de tudo isso, porque ele ia trabalhar, precisava descansar, ela entrava no trabalho um pouco mais tarde e saia mais cedo, suportaria noites sem dormir. Pra levar as crianças no parque era só alegria, levar pro hospital nem pensar, passava mal, dava sono...a parte boa era com ele, a dificil era ela. Como uma boa Amélia ela relevou tudo depois, mesmo tendo sido expulsa de casa. Deu a volta por cima da própria dignidade jogada no chão. As humilhações se suscederam, uma piada aqui, uma patada acolá, até ele jogar na cara dela as dividas, derepente as dividas viraram NOSSAS. Ela que não ficasse dormindo até tarde, quando tinha dividas a pagar.(Foi isso que ele quis dizer quando de manhã cedo antes de ir trabalhar anotou e grudou na geladeira o valor, ou a estava proibindo de comer já que tinha aquela dívida? Ficou confusa, o fato é que era um aviso cruel.)Há semanas que ela tentava arrumar emprego, diante daquela ameaça, tornava-se urgente e desesperador a procura de trabalho. Arrumava emprego mas não combinava com o harário da escola da criança mais nova, outro era longe, outros não davam resposta, era uma batalha travada contra o tempo, se não a divida ia aumentar mais e mais. Deixaram de se falar, apenas o essencial, havia noites em que ela chorava pensando que tinha nele um amigo, era alguém pra conversar, brincar, havia perdido o marido, perdera tambem o amigo. Brigas entre casais acontecem, mas sempre se preserva o lado amigo, mas no caso não,ela achava que ele nem pensava nisso, talvez porque nunca viu nela uma amiga, um ser humano, descobriu que sempre foi apenas mulher e mãe dos filhos dele, com apenas obrigações de dona de casa. Há muitos anos não ganhava nem uma flor em datas comemorativas,os aniversários de casamento foram esquecidos, ou sem importancia, quando chegava o dia do aniversário de casamento ela esperava algo como toda mulher espera, ela chorava e pensava que infelizmente não era uma esposa amada,merecedora de um agrado, que mesmo com defeitos, sempre nessa data teria perdão. Nada, passaram- se em branco muitas datas, repensando nas anteriores, sempre fora ela que pedira um presentinho. Definitivamente ele achava mesmo que ela não era nada. Aquela dor aumentava em seu peito. Deixou de sentir desejos por ele, algo morria aos poucos dentro dela. Se existisse amor da parte dele, certamente ele expressaria, mas se não existia, nada podia fazer. O fato é que tudo acabou sem que percebessem, só restou as cobranças, a parte boa se foi, restou o pior...Depois dessa longa narrativa vamos a Moral da história, ela arrumou emprego, pagou as dívidas,as crianças cresceram e num dia em que estava tudo normal ele veio abraça-la como se nada tivesse acontecido. Ela olhou para ele e perguntou: Te devo mais alguma coisa? Sim ele respondeu: muitos beijos, abraços e cumprir com seu dever de esposa, (ou seja sexo pensou). Ela olhou para ele incrédula, era muita cara de pau. Saiu fez as malas e disse: Voce me cobrou dividas em dinheiro, o resto voce sempre teve de graça, nada lhe devo, sendo assim estamos quites. Na rua com as malas, ela pegou o celular deu um telefonema, minutos depois encostou um BMW conversivel, o motorista desceu, pegou as malas, abriu a porta de tras para ela. Tudo que ela disse diante da perplexidade dele foi: hasta la vista BABY.